É preciso ver as imagens em ação e a vida ao longo do tempo e não apenas reduzi-la a conceitos e palavras aprendidas na escola. Não podemos reduzir a educação da escola e seus processos de ensino e avaliação que privilegiam a formação de uma mente letrada baseada em séries e currículos escolares. Muitas coisas, saberes e pessoas se tornam invisíveis pelo consumo, mídia, igrejas, poderes políticos, e currículos inclusive e principalmente a razão instrumental e nossos meios de interpretação, incluindo nossos olhares e palavras que tendem a avaliar e julgar sem conhecer.
A ordem visível é a primeira injustiça que aprendemos e rege o mundo das desigualdades e violências que afetam a ética, estética e justiça social de estudantes e professores reféns apenas da escola e famílias. “Há um pequeno número de pessoas que vemos e ouvimos e existe uma massa indistinta dos que não vemos nem ouvimos” Muitos que trabalham ou vivem em comunidades pobres são invisíveis e não aprendemos sobre eles, e outras questões, temas e problemas críticos de nossa sociedade. É preciso educar para transformar a visibilidade desses seres e coisas como por exemplo a natureza destruída pelas mudanças climáticas ou as desigualdades, os modos como são visíveis e pensados mas também as próprias formas da visibilidade transformando os espaços educacionais não escolares em salas de aulas vivas. Redesenhar as paisagens do mundo com outros sentidos agora feitas por estudantes e professores; e não apenas esperar por aqueles que se dedicam à Ciência e a Universidade venham cumprir esse papel muitas vezes tirando a autonomia e autoria das pessoas em escrevem suas próprias histórias e sentidos.
O mundo e a realidade são o resultado de toda uma estruturação do perceptível, dizível e pensável que Jacques Ranciere denomina partilha do sensível. Precisamos educar a sensibilidade que forma razões e frustrar as visões que querem reduzir as sensibilidades, éticas e estéticas que colocam sua participação na ordem do sensível indo além de uma lei dogma derivada de uma necessidade econômica, histórica, sociológica, educacional ou outras. Desobrigar aqueles que ocupam determinados lugares na ordem social a adotar determinados modos de fazer, pensar ou ver que correspondem a esse lugar; e os constrange a, por sua vez, a reproduzir a ordem das coisas que os atribui a esses lugares. “Se é importante mostrar a ficção em ação naquilo que se passa por real, é também central reintroduzir, naquilo que nos é dado como necessidade, a contingência na qual se traçam os caminhos de emancipação. “ Jacques Ranciere.
Educar outras formas de fazer, pensar e ver no encontro dialógico com outras realidades; e no diálogo com o diferente e diverso que pensa e age diferente de mim em espaços educacionais não escolares é o propósito de outras práticas pedagógicas e formas de aprendizagem e autonomia. Contra lógicas que se propõe explicar tudo e eternizar em conceitos sem vida, buscamos singularidades em transformação que se expressam em acontecimentos, textos, imagens, corpos em movimentos em realidades múltiplas e diversas visando apreender o modo como sua racionalidade se constitui no próprio nível de sua emergência singular e autônoma.
DANDO VIDA AOS CONCEITOS EM UMA EDUCAÇÃO COMPLEXA E SISTÊMICA VIVENCIADA EM ESPAÇOS EDUCACIONAIS NÃO ESCOLARES.
Henri Bergson em sua obra investiga "entre essas duas questões: Qual a natureza do tempo? e Qual a natureza do pensamento conceitual? – há uma solidariedade íntima “
A primazia do conceito sufoca a intuição e fragmenta a inteligência prejudicando a aprendizagem. Nem o tempo do senso comum ou da ciência é o tempo real, ou seja, o tempo tem duração e movimento independente do conceito científico ou das palavras que o representam no cotidiano que buscam conquistá-lo por meio de nomeações. Os espaços são heterogêneos e as durações dos movimentos desigualmente tensionadas e ricas é impossível prendê-la em poucos conceitos e somente nos espaços e métodos da escola.
A mente corpórea ou o corpo sem órgãos que inclui a mente e o ambiente nele inserido, dialoga, aprende e se expressa por diversos sentidos desde o olhar, o tato, o cheiro, o movimento do corpo, o paladar e claro o cérebro mas também pelos óculos que usamos, os instrumentos de pesquisa científica, os computadores , celulares, e cada vez mais robôs , engenharia genética e inteligência artificial se incorporam aos nossos corpos e de animais apontando uma sociedade pós humana no mundo em mudanças climáticas.
“Assim como um historiador concentra uma pluralidade de fatos elementares num único fato...Na sensação vemos que pensar é deter, fixar...” Na filologia nada prova que sujeito, verbo e complemento seja um quadro do pensamento, afinal existem línguas que não possuem verbos. Porém existem o substantivo , a coisa, e o adjetivo que compõe a realidade que nomeamos. Porém a realidade e o movimento é una, indivisível, fluida e móvel quando não fixamos ela é um ponto preso ao contexto de um espaço. Assim, antes do trabalho racional, obra da inteligência, é preciso algo de não separado, indistinto, que tornará possível a distinção, o conceito. No começo do ato de aprendizagem encontramos uma continuidade móvel, o movimento, o contínuo, a duração, o tempo. Aprender a duração e o movimento, atrás do conceito fixo, “liberta-se dos conceitos e das categorias, libertar-se deles ao menos por um instante para retomar consciência da realidade, para alcançar outras categorias mais fluidas, mais concebíveis para imaginação; reformular, numa palavra, nossos conceitos habituais para obter outros, mais fluidos, mais aptos para captar o devir...isto é, a eternidade do devir e não a eternidade do conceito que é uma eternidade da morte.”
O pensamento abstrato lógico, apenas alinhara símbolos, mas deixa escapar a espontaneidade contínua da evolução, a raiz da liberdade. Daí a importância de práticas pedagógicas como pesquisa, autobiografia, e pensarmos a relações entre família, escola, comunidade e espaços educacionais não escolares como instrumentos que nos ajudam a desenvolver a visão sistêmica sobre a jornada de vida e aprendizagens não apenas por meios lineares e fragmentados e sim por caminhos caóticos em movimento.
“Existe uma falsa clareza que consiste em partir do estável e do distinto para dirigir-se ao instável e indistinto. É, ao contrário, desse instável e indistinto que é preciso partir.... Toda descoberta científica é um lançamento de sonda na mobilidade do devir. A exposição limita-se a expor ideias mas a invenção consiste penetrar na mobilidade do devir...“