Se cada um de nós conhecesse alguns conceitos da psicologia
para utilização em nossa vida , no cotidiano e nas atitudes que nos movem ,
serviria como uma bussola para refletir sobre os mapas que temos usados para
conduzir nossos passos.
Por exemplo, numa reunião de condomínio dominado por
neuróticos que querem comandar e controlar tudo e todos se fazem necessário
este exercício. As vezes eles querem impedir que os funcionários e domesticas
que trabalham no prédio conversem entre si, assistam televisão e outros.
Simplesmente porque não suportam as pequenas alegrias da vida que todos no
mundo têm direito.
Outro exemplo é que para muitos a solução para os jovens
seria impor mais limites, voltar as regras e a moral do passado para que nem os
jovens nem os pais, tenham que enfrentar as questões da liberdade humana .
Portanto é preciso lidar com idéias como pulsão de morte e
de vida, compreender o Narcisismo e a Angustia, em como o Eu tem sido servo de
três grandes senhores: a censura do super eu, o mundo externo e o que penso,
sinto, como me comporto. Entender que este
Eu não é o lugar do conforto nem do consumo, mas do desassossego, aonde
temos que lidar com os sentimentos de culpa, vergonha, inferioridade e
outros.Entender que o mundo não é pesado mas que somos nós que colocamos este
peso.E como diria o Doutor em Psicologia Clinica Contardo Calligaris devanear é
preciso para sobreviver a este mundo.
Antes de evoluir neste debate vamos primeiro compreender
como o pensamento psicológico nasceu e foi construído na humanidade a partir do
livro Nascimento da clinica de Foucault e de outro livro Estrutura e
Constituição da clinica psicanalítica de Dunker.
Como nasce o vinculo do saber com o sofrimento? No primeiro momento a presença da doença no
corpo, nas entranhas, se faz necessário construir uma linguagem, conceitos,
para falar sobre as doenças, algo que
possa ser “racional”. Foucault nos lembra que “As lâminas esbranquiçadas e
avermelhadas de Bayle tem, para um discurso cientifico, valor diferente, solidez e objetividade maior do que as
pequenas lâminas endurecidas descritas pelos médicos do Século 18 antes do
nascimento da Ciência e da Clinica?
Antes da Clinica e da Ciência as coisas e as palavras ainda
não se separaram para dar origem aos conceitos que vão mapear e classificar as
doenças. Cada dia mais nos hospitais e nas Universidades, formando médicos que
se comunicam entre si e os remédios.
Antes na linguagem modo de ver e
de dizer ainda se comunicam diretamente. “Será preciso questionar a
distribuição originária do visível e do dizível, na medida em que este ligado a
separação do que se anuncia e do que é silenciado: surgira então, em uma figura
única, a articulação da linguagem medica com seu objeto.” Agora as doenças têm
espaços e denominações que se revelam patológicas aonde nasce o olhar “que o
medico põe sobre o coração venenoso das coisas.”
A medicina moderna nasce nos últimos anos do Século 18.
Outra percepção sobre as coisas ganha forma e bussolas em nossas vidas. O
olhar, agora a fonte da clareza, não este mais voltado às idéias do Iluminismo,
ele se torna moderno. O discurso racional apoiasse na espessura do objeto da
doença, em sua presença obscura, onde estão a origem, o domínio e o limite da
experiência.
Cabe agora a esta linguagem das coisas, autorizar, a respeito do
individuo, um saber para além do histórico ou estético. O olhar não é mais
redutor mais fundador do individuo em sua qualidade irredutível. Recolhemos em
um prontuário individual, a totalidade das informações que dispomos a seu
respeito. Nós observamos como uma experiência de laboratório. Estamos entregues
a paciente construção de discursos sobre discursos, a tarefa de ouvir o que já
foi dito nas cadeiras das Universidades e nos hospitais.
Porem muitas coisas não é ditas nas palavras nem são
exclusivas daquele objeto que quer determinar tudo a doença, a cura, a vida.
A clinica e seu
empirismo, atenção e cuidado para que as coisas se “apresentem ao olhar”, é na
verdade uma construção de um discurso sobre a doença. Este discurso pretende
submeter todos os dogmas as regras da boa lógica e definir palavras para
circunscrever as definições de cada
doença.
Isto resulta num quadro nosológico onde o parentesco entre
as doenças assim como nas plantas e animais é formalizável. É a partir dai que
vamos buscar o encadeamento entre efeitos e causas, a serie cronológica dos
acontecimentos e de seu trajeto visível no corpo. E este espaço e linguagens
construídos tornam-se anterior as percepções e é dirigido de longe; “é a partir
dele, das linhas que cruza, das massas que distribui ou hierarquiza, que a
doença, emergindo ao olhar, insere suas características próprias em um
organismo vivo.”
A designação entre causas próximas é o primeiro passo. Ao se
definir uma região no corpo, aonde as perspectivas se nivelam, o efeito tem o
mesmo estatuto que sua causa, o antecedente coincide com o que se segue. Neste
espaço homogêneo, o tempo se aniquila, não se leva em questão sua rede de
determinações recíprocas ou seu entrecruzamento temporal.
A racionalidade da vida é idêntica daquilo que a ameaça. Elas não estão uma com relação à
outra. O paciente é apenas algo exterior em relação aquilo de que sofre. Claro
é preciso conhecer a estrutura interna de nosso corpo; mas isso para melhor
subtrair e libertar, sob o olhar do medico, “a natureza e combinação dos
sintomas, das crises e das outras circunstâncias que acompanham a doença. Não é
o patológico que funciona com relação à vida, mas o doente com relação a
própria doença.
O conhecimento das doenças é a bussola do medico, o sucesso
da cura depende de um exato conhecimento da doença. O olhar do medico não se
dirige inicialmente ao corpo concreto, mas a classificação das doenças.
Forma-se uma rede que oculta o doente real e impede toda terapia. Quando
administrado muito cedo, o remédio contradiz e confunde a essência da doença, a
impede de aceder sua verdadeira natureza e, fazendo-a irregular, torna-a
intratável.
O medico fica na expectativa, pois “os começos da doença
existem para fazer conhecer sua classe, seu gênero e sua espécie; quando os
sintomas aumentam e ganham amplitude, basta diminuir sua violência e suas
dores.
O que gera tudo isto é o pensamento classificatório das
doenças que se dá num espaço essencial. O belo espaço plano do retrato é, ao
mesmo tempo, a origem e o resultado ultimo; o que torna possível, na raiz, um
saber médico racional e certo.Este olhar , progredindo recua, visto que só
atinge a verdade da doença, deixando-a vencê-lo, esquivando-se e permitindo ao
próprio mal realizar, em seus fenômenos, sua natureza.
“Como o espaço plano, homogêneo das classes pode se tornar
visível em um sistema geográfico de massas diferenciadas por seu volume e sua
distância? Como uma Doença, definida por seu lugar em uma família, pode se
caracterizar por sua sede em um organismo? neste espaço corporal em que circula
livremente, a doença sofre metástases e metamorfoses. Os deslocamentos
remodelam em parte. Daí a ideia de uma causalidade que se manifesta em um ligeiro deslocamento temporal. A
causalidade assegura as simultaneidades e os intercruzamentos que misturam as
purezas essenciais.
O tempo é integrado não como variável orgânica, mas como
parte da doença. O tempo do corpo não modifica, e muito menos determina o tempo
da doença. Ela independe do corpo, do meio ambiente e outras causas sociais.
O que faz o corpo essencial da doença se comunicar com o
corpo real do doente não são, portanto, nem os pontos de localização, nem os
efeitos da duração; é antes, a qualidade. A doença e o corpo só se comunicam
através do elemento não espacial da qualidade.
Os médicos devem se limitar a conhecer as forças dos
medicamentos e das doenças por meio de suas operações; deve-se observá-las com
cuidado, se aplicar em conhecer suas leis e não se esgotar na investigação das
causas físicas.
É no hospital, um lugar artificial em que a doença,
transplantada, corre o risco de perder seu aspecto essencial. Ela se mistura
com outras doenças. “Com efeito, nenhuma doença no hospital é pura.”
O hospital, criador de doenças. Esta separação destinada a
proteger, comunica a doença e a multiplica infinitamente.
Portanto são estas as origens do pensamento classificatório
e disciplinador de como foi gerada a medicina, as doenças, os remédios, o
hospital, a clinica. Dele emergem a necessidade de um saber psicológico sobre o
homem, a vida, suas loucuras, e agora sofrimentos psíquicos. A racionalidade
classificatória dá lugar ao irracional, aos sonhos, a histeria, ao sexo, aos
complexos em Freud.
As origens do pensamento psicológico vêm também com a
Revolução Francesa, a guilhotina, a ideia de perder a cabeça, ou seja, ser
cortada por perseguição política ou perder a cabeça na loucura como 46
pacientes que deram entrada no Hospício achando que era Napoleão. Pinel estava
lá com seus hospícios, isolamento, choque ate entendermos que tudo isto e
apenas humano, demasiadamente humano, mas também todos os dias mais complexos,
sistêmico, social e ecológico. Novas palavras, novos conceitos, novas doenças e
formas de tratá-las.
Novas origens do pensamento psicológico nos desafiam em outros textos.