O Brasil tem em sua origem e história profundas marcas da violência que reverberam até hoje quando queremos tratar problemas públicos ou políticos como crime e as violências.
No país dos filmes Cidade de Deus e Tropa de Elite ou você está de um lado ou de outro, porém quando vivenciamos situações como o tráfico internacional, economia global, que aprofunda nossas desigualdades, influência da política externa, domínio da internet e das novas tecnologias nas mídias sociais, temos que repensar essas questões muito além do debate local, pautado pela violências históricas e fragmentação dos saberes.
Perguntei uma vez ao ator Selton Melo se o cinema tinha capacidade de humanizar as pessoas... e por que não também as escolas, universidades, comunidades, igrejas, já que estas perderam a capacidade de nos humanizar?
Num mundo em que jovens vibram jogando games como GTA ou que traficantes treinam garotos jogando games violentos... Qual o nosso papel ao criar um game no celular do jovem para tirá-lo da violência, diante de tantos desafios e influências da comunidade onde mora, organizações, filmes, games, séries e mídias sociais? Primeiro, reconhecer que não podemos criar um mundo fictício como de Alice no País das Maravilhas. E sim, partir da realidade nua e crua na qual o tráfico atua nas comunidades e cidades.
Por um lado o Brasil durante um tempo glamorizou a vida de traficantes como se fossem heróis, ocupando o imaginário de nossa juventude. Da mesma forma que Clube da Luta alavancou a UFC e Tropa de Elite alavancou a imagem autoritária do policial. Porém, a realidade não reflete esses modelos estereotipados.
Por isso, na história (ou storyline do game) abordamos as transformações tecnológicas, assim como as desigualdades econômicas e sociais que nos afetam hoje. Seguindo esse caminho temos traficantes presos , personagens no game, que possuem vidas nada glamourosas em presídios nacionais condenados pelo resto de suas vidas. Eles contam histórias de quantos foram mortos e todas as tragédias dos que viveram pouco ou nada viveram.
O objetivo é divulgar que o caminho do crime é terrível, morrendo ou vivendo isolados. Presídios nacionais e força nacional lidam todos os dias com essas situações e pessoas, eles também são personagens de nossa história. Escutar suas vozes é tão importante quanto ouvir os que defendem a ressocialização e os direitos humanos.
Não são caminhos opostos são complementares, na mesma proporção que precisamos garantir a cidadania, precisamos de boas leis e boa polícia para garantir o Estado e que as leis sejam cumpridas. Não podemos glamorizar o crime nem os políticos corruptos, devemos buscar garantir a lei, junto com os direitos humanos e a proteção dos nossos policiais, sem dicotomias limitantes. Pois, na verdade, não existem políticos corruptos, apenas ladrões.
Portanto, conquistar a mente e o coração dos jovens, abrir e viabilizar oportunidades de vida que são direitos humanos ao mesmo tempo que educamos para a justiça, como fazem Canadá, países nórdicos, nossos povos originários, etc.
A nossa guerra não é entre direitos humanos versus a lei, pois são faces da mesma moeda. Da mesma forma que o crime organizado e a corrupção são faces da mesma moeda.
Infelizmente, a universidade, a mídia, e a sociedade têm produzido seres fragmentados, por não agregarem outros saberes a sua visão de mundo. Diante de problemas cada vez mais complexos e sistêmicos tem-se produzidos visões parciais e dogmáticas que não exercem o verdadeiro papel crítico e criativo do saber que tem o poder de transformar pessoas e sociedades. Sim! Precisamos de novas formas de fazer arte, de educar e de emancipar cidadãos com o poder da ética e da estética, para contrapor as violências que afetam a todos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário