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sexta-feira, 1 de agosto de 2025

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Por que Trump (e os EUA) podem ter que pagar caro por aumento de tarifas

 

Donald Trump

Crédito,Getty Images

Em abril, Donald Trump surpreendeu o mundo ao anunciar novas tarifas de importação abrangentes — e suspendeu a maioria delas em meio ao pânico financeiro global resultante.

Quatro meses depois, o presidente dos Estados Unidos está promovendo o que ele afirma ser uma série de vitórias, tendo anunciado alguns acordos com parceiros comerciais e imposto tarifas unilateralmente a outros, tudo isso sem a turbulência no mercado financeiro que sua tentativa inicial provocou.

Pelo menos até agora.

Depois de trabalhar para reposicionar os EUA na economia global, Trump agora promete que o país vai colher os frutos das novas receitas, revitalizar a indústria nacional e gerar centenas de bilhões de dólares em investimentos e compras estrangeiras.

Se isso realmente vai acontecer — e se essas ações vão ter consequências negativas —, ainda é uma grande dúvida.

O que está claro até agora, no entanto, é que uma maré que estava virando (suavemente) em relação ao livre comércio, mesmo antes do segundo mandato de Trump, se tornou uma onda que está se espalhando pelo mundo. E embora esteja remodelando o cenário econômico, não deixou o rastro de destruição que alguns poderiam ter previsto — embora, é claro, muitas vezes haja uma defasagem até que o impacto seja totalmente percebido.

Além disso, para muitos países, tudo isso serviu como um alerta — a necessidade de permanecer atento a novas alianças.

Assim, embora o resultado a curto prazo possa ser — na visão de Trump — uma vitória, o impacto sobre seus objetivos gerais é muito menos claro. O mesmo vale para as repercussões a longo prazo, que podem muito bem se revelar bem diferentes para Trump — ou para os EUA que ele vai deixar após seu mandato atual.

O prazo de '90 negócios em 90 dias'

Por todas as razões erradas, o dia 1º de agosto estava marcado na agenda dos formuladores de políticas internacionais. Eles foram avisados de que deveriam chegar a um acordo sobre novos termos comerciais com os EUA até essa data, ou enfrentariam tarifas potencialmente devastadoras.

Embora o assessor comercial da Casa Branca, Peter Navarro, tenha previsto "90 acordos em 90 dias", e Trump tenha oferecido uma perspectiva otimista sobre a conclusão dos acordos, esse prazo sempre pareceu um grande desafio. E foi mesmo.

Quando chegou no fim de julho, Trump havia anunciado apenas cerca de uma dúzia de acordos comerciais — alguns com no máximo uma ou duas páginas, sem as cláusulas detalhadas que eram padrão em negociações anteriores.

O presidente dos EUA, Donald Trump, e o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, celebrando um acordo comercial assinado durante uma reunião na cúpula do G7

Crédito,REUTERS/Suzanne Plunkett/Pool

Legenda da foto,A tarifa básica de 10% aplicada à maioria dos produtos britânicos causou espanto no início, mas foi um alívio em comparação à taxa de 15% aplicada a outros parceiros comerciais
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Fim do Que História!

O Reino Unido foi o primeiro a agir, talvez inevitavelmente. Afinal, o maior pesadelo de Trump é o déficit comercial dos EUA, e o comércio está em equilíbrio quando se trata do Reino Unido.

Embora a tarifa base de 10% aplicada à maioria dos produtos britânicos possa inicialmente ter causado espanto, ela deu uma ideia do que estava por vir — e, no fim das contas, foi um alívio em comparação com a taxa de 15% aplicada a outros parceiros comerciais, como a União Europeia e o Japão, com os quais os EUA têm déficits maiores: US$ 240 bilhões e US$ 70 bilhões, respectivamente, somente no ano passado.

E mesmo esses acordos vieram com condições. Os países que não puderam se comprometer, por exemplo, a comprar mais produtos americanos, muitas vezes enfrentaram tarifas mais altas.

Coreia do Sul, Camboja, Paquistão — à medida que a lista crescia e cartas tarifárias eram enviadas para outros lugares, a maior parte das importações americanas agora é coberta por um acordo ou um decreto presidencial concluído com um breve "obrigado por sua atenção a este assunto".

Capacidade de 'prejudicar' a economia global

Muito foi revelado como resultado disso.

Primeiro, as boas notícias. As negociações dos últimos meses significam que as tarifas mais dolorosas e os alertas de recessão foram evitados.

Os piores temores — em termos de níveis tarifários e possíveis repercussões econômicas (para os EUA e outros países) — não se concretizaram.

Um veleiro passa por um navio porta-contêineres no porto de Oakland, em Oakland, na Califórnia

Crédito,JOHN G MABANGLO/EPA/Shutterstock

Legenda da foto,Os maiores temores — os alertas de um possível desastre econômico — diminuíram

Em segundo lugar, o acordo sobre os termos tarifários, por mais desagradável que fosse, reduziu grande parte da incerteza (utilizada pelo próprio Trump como uma poderosa arma econômica) para o bem — e para o mal.

Para o bem, no sentido de que as empresas podem fazer planos, e investimentos e decisões de contratação que estavam suspensos agora podem ser retomados.

A maioria dos exportadores sabe que tarifas seus produtos enfrentam — e pode descobrir como se adaptar ou repassar o custo aos consumidores.

Essa sensação crescente de certeza gera um clima mais tranquilo nos mercados financeiros, com as ações nos EUA subindo notavelmente.

O presidente dos EUA, Donald Trump, cumprimentando a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen

Crédito,REUTERS/Evelyn Hockstein

Legenda da foto,Trump enalteceu o acordo dos EUA com a União Europeia

Mas é para o mal, no sentido de que a tarifa típica para vender nos EUA é mais alta do que antes – e mais extrema do que os analistas previram há apenas seis meses.

Trump pode ter enaltecido a dimensão do acordo dos EUA com a União Europeia – mas não se trata dos acordos que derrubavam tarifas e eliminavam barreiras comerciais, como nas décadas anteriores.

Os maiores temores, os alertas de um possível desastre, diminuíram. Mas Ben May, diretor de previsões macroeconômicas globais da Oxford Economics, afirma que as tarifas dos EUA têm o potencial de "prejudicar" a economia global de várias maneiras.

"Elas estão obviamente aumentando os preços nos EUA e reduzindo a renda das famílias", diz ele, acrescentando que as políticas também reduziriam a demanda ao redor do mundo se a maior economia do mundo acabasse importando menos produtos.

Vencedores e perdedores: Alemanha, Índia e China

Não se trata apenas do valor da tarifa, mas da magnitude da relação comercial com os EUA. Assim, embora a Índia possa enfrentar tarifas superiores a 25% sobre suas exportações para os EUA, economistas da Capital Economics estimam que, com a demanda americana representando apenas 2% do Produto Interno Bruto (PIB) indiano, o impacto imediato no crescimento pode ser mínimo.

As notícias não são tão boas para a Alemanha, onde as tarifas de 15% podem reduzir o crescimento deste ano em mais de meio ponto percentual, em comparação ao que era esperado no início do ano.

Isso se deve ao tamanho do seu setor automotivo — o que não ajuda uma economia que pode estar à beira da recessão.

O presidente dos EUA, Donald Trump, mostrando uma tabela de 'tarifas recíprocas'

Crédito,Chip Somodevilla/Getty Images

Legenda da foto,A Índia se tornou a principal fonte de smartphones vendidos nos EUA recentemente, após temores sobre o que pode estar reservado para a China

Enquanto isso, a Índia se tornou a principal fonte de smartphones vendidos nos EUA nos últimos meses, depois que os temores sobre o que poderia acontecer com a China levaram a Apple a transferir sua produção.

Por outro lado, a Índia está ciente de que países como o Vietnã e as Filipinas — que enfrentam tarifas mais baixas ao vender para os EUA — podem se tornar fornecedores relativamente mais atraentes em outros setores.

De modo geral, porém, há um alívio pelo fato de que o impacto, pelo menos, provavelmente será menor do que poderia ter sido. Mas o que já foi decidido aponta para ramificações de longo prazo para os padrões comerciais globais e alianças em outros lugares.

E o elemento de risco introduzido em uma relação de longa data com os EUA deu um impulso adicional à busca do Reino Unido por laços mais fortes com a União Europeia — e obtenção de um acordo comercial com a Índia.

Para muitos países, isso serviu como um alerta — a necessidade de permanecer atento a novas alianças.

Uma ameaça política bastante real para Trump?

À medida que os detalhes são definidos, as implicações para a economia dos EUA também ficam mais claras.

O crescimento no fim da primavera no hemisfério norte foi beneficiado por uma onda de vendas de exportação, já que as empresas se apressaram para evitar tarifas mais altas impostas aos produtos americanos.

Os economistas esperam que o crescimento perca força ao longo do resto do ano.

As tarifas, que aumentaram de uma média de 2% no início do ano para cerca de 17% atualmente, tiveram um impacto notável nas receitas do governo dos EUA — um dos objetivos declarados da política comercial de Trump. Até agora, os impostos de importação arrecadaram mais de US$ 100 bilhões este ano — cerca de 5% da receita federal dos EUA, em comparação com cerca de 2% nos anos anteriores.

O secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, disse que espera que a receita tarifária deste ano totalize cerca de US$ 300 bilhões. Para efeito de comparação, os impostos federais sobre a renda geram cerca de US$ 2,5 trilhões por ano.

Os consumidores americanos continuam na linha de frente, e ainda não viram os preços mais altos serem repassados integralmente. Mas, à medida que gigantes do setor de bens de consumo, como Unilever e Adidas, começam a calcular os aumentos de custos envolvidos, um aumento de preços se aproxima — potencialmente o suficiente para adiar o corte de juros desejado por Trump —, e possivelmente reduzir os gastos do consumidor.

Donald Trump

Crédito,REUTERS/Evelyn Hockstein

Legenda da foto,Se as tarifas atuais provocarem um realinhamento fundamental, os resultados podem não acabar sendo favoráveis aos EUA

As previsões são sempre incertas, é claro, mas isso representa uma ameaça política bastante real para um presidente que prometeu reduzir os preços ao consumidor, e não tomar medidas que os aumentariam.

Trump e outros funcionários da Casa Branca lançaram a ideia de fornecer cheques de reembolso aos americanos de baixa renda — o tipo de eleitor da classe trabalhadora que impulsionou o sucesso político do presidente —, para compensar parte do impacto no bolso do consumidor.

Tal esforço poderia ser complicado, e exigiria a aprovação do Congresso.

É também um reconhecimento tácito de que simplesmente se gabar de novas receitas federais para compensar os gastos atuais e os cortes de impostos, e manter a perspectiva de geração futura de empregos e riqueza no país, é politicamente perigoso para um Partido Republicano que terá que enfrentar os eleitores nas eleições de meio do mandato estaduais e para o Congresso no próximo ano.

Os acordos que ainda precisam ser fechados

Para complicar ainda mais a situação, há muitos lugares onde ainda não se chegou a um acordo – em particular, no Canadá e em Taiwan.

O governo dos EUA ainda não se pronunciou sobre suas decisões para as indústrias farmacêutica e siderúrgica. A questão colossal da China, sujeita a um prazo diferente, continua sem solução.

Trump concordou com uma prorrogação das negociações com o México, outro importante parceiro comercial dos EUA, na manhã de quinta-feira.

Muitos dos acordos firmados foram verbais, e ainda não foram assinados. Além disso, não se sabe se e como as condições vinculadas aos acordos de Trump – mais dinheiro a ser gasto na compra de energia americana ou investido nos EUA – serão realmente cumpridas.

Em alguns casos, líderes estrangeiros negaram a existência das cláusulas enaltecidas pelo presidente.

Donald Trump durante reunião com Benjamin Netanyahu no Salão Oval da Casa Branca

Crédito,YURI GRIPAS/POOL/EPA-EFE/REX/Shutterstock

Legenda da foto,O objetivo geral de Trump — trazer de volta a produção e os empregos para os EUA — pode ter um sucesso muito limitado

Quando se trata de avaliar os acordos tarifários entre a Casa Branca e vários países, diz May, "o problema está nos detalhes" — e os detalhes são escassos.

Ficou claro, no entanto, que o mundo recuou do precipício de uma guerra comercial devastadora. Agora, enquanto as nações lidam com um novo conjunto de barreiras comerciais, Trump pretende dar as cartas.

Mas a história nos mostra que seu objetivo geral – trazer de volta a produção e os empregos para os EUA – pode ter um sucesso muito limitado. E os parceiros comerciais de longa data dos EUA, como o Canadá e a União Europeia, podem começar a buscar relações econômicas e políticas que burlem o que eles não consideram mais um aliado econômico confiável.

Trump pode estar se beneficiando da vantagem proporcionada pela posição única dos EUA no centro de uma ordem comercial global que levou mais de meio século para ser estabelecida. No entanto, se as tarifas atuais desencadearem um realinhamento fundamental, os resultados podem não ser favoráveis aos EUA.

Essas questões serão respondidas ao longo de anos, não de semanas ou meses. Enquanto isso, os próprios eleitores de Trump ainda podem ter que arcar com os custos — por meio de preços mais altos, menos opções e crescimento mais lento.

Reportagem adicional de Michael Race

Trump: 'Lula pode falar comigo quando quiser' YES WE CAN!

 

Trump em gramado, diante do microfone de repórteres

Crédito,Reuters

Legenda da foto,Falando a jornalistas, Trump disse 'amar' o povo brasileiro

presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou nesta sexta-feira (01/08) estar disponível para falar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"Ele pode falar comigo quando quiser", disse Trump à jornalista Raquel Krähenbühl, da TV Globo, que perguntou ao americano se ele está aberto a negociar com o Brasil e a ter uma conversa com Lula.

Desde que Trump assumiu a Casa Branca em janeiro, ele e o presidente brasileiro nunca se encontraram ou falaram por telefone.

A nova declaração de Trump ocorre em meio a uma crise entre os dois países sobre tarifas comerciais e sanções dos EUA ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

Perguntado por Krähenbühl sobre o que está sendo discutido em relação ao Brasil, o americano respondeu: "Vamos ver o que acontece, mas eu amo o povo brasileiro."

A jornalista, então, perguntou qual seria a motivação para as tarifas de 50%.

"As pessoas que governam o Brasil fizeram a coisa errada", respondeu Trump.

Após as declarações de Trump, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que o aceno de Trump foi "ótimo".

"Eu acho ótimo, né? E a recíproca eu tenho certeza que é verdadeira, também, né. O presidente Lula estaria disposto a receber um telefonema dele quando ele quisesse também. E, conforme eu já disse anteriormente, é muito importante a gente preparar esse encontro, preparar essa conversa", afirmou Haddad a jornalistas, em Brasília, na noite de sexta-feira.

O ministro acrescentou que sua equipe está buscando uma reunião semana que vem com o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, que deve acontecer — mas ainda não tem data exata.

Segundo Haddad, seu encontro com Bessent pode preparar o terreno para um eventual contato entre Lula e Trump.

Lula gesticulando enquanto discursa

Crédito,EPA

Legenda da foto,Há temor no entorno do presidente Lula de que um eventual contato com Trump acabe gerando constrangimentos
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Fim do Que História!

Críticos a Lula têm cobrado que o presidente se esforce por uma aproximação de Trump e demonstre isso, por exemplo, com uma ligação para o presidente dos Estados Unidos.

Entretanto, uma fonte disse à BBC News Brasil que há temor no governo de que uma ligação do tipo possa expor o presidente brasileiro a algum constrangimento como os que ocorreram em encontros de outros chefes de Estado com Trump, como o presidentes da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, e da África do Sul, Cyril Ramaphosa.

Na quarta-feira (30/07), Trump formalizou as tarifas de 50% contra o Brasil, embora quase 700 produtos tenham sido isentos da taxa. A entrada em vigor da medida foi postergada, para 6 de agosto.

Tanto as tarifas quanto as sanções são baseadas no argumento de que o Judiciário brasileiro estaria fazendo uma "caça às bruxas" contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, réu por tentativa de golpe de Estado em ação no STF, da qual Alexandre de Moraes é o relator.

Peter Cetera and Cher - After All


 

'Uso da Lei Magnitsky contra Alexandre de Moraes é deturpação', diz criador da lei à BBC

 

Bill Browder

Crédito,Divulgação/Intrínseca

Legenda da foto,Para Bill Browder, que liderou campanha internacional pela aprovação da Lei Magnitsky, a legislação não foi criada para resolver vinganças políticas e há fortes argumentos para que decisão contra Moraes seja revertida nos tribunais
    • Author,Thais Carrança
    • Role,Da BBC News Brasil em São Paulo

O uso da Lei Global Magnitsky para impor sanções contra o ministro Alexandre de Moraes é um abuso das intenções da lei e uma deturpação de sua concepção original, avalia William Browder, executivo financeiro britânico que liderou a campanha pela aprovação da lei nos Estados Unidos.

"A Lei Magnitsky foi estabelecida para impor sanções a graves violadores dos direitos humanos e pessoas que são culpadas de cleptocracia em larga escala", diz Browder, referindo-se a regimes políticos em que governantes e autoridades usam sua posição para enriquecer de forma ilícita.

"Ela não foi criada para ser usada para vinganças políticas. O uso atual da Lei Magnitsky é puramente político e não aborda as questões de direitos humanos para as quais ela foi originalmente elaborada. E, como tal, é um abuso das intenções da lei", completou o executivo, em entrevista à BBC News Brasil.

O uso da Lei Magnitsky contra Moraes foi anunciado na quarta-feira (30/7) pelo governo americano, que justificou a medida afirmando que o ministro seria responsável por "uma campanha opressiva de censura, detenções arbitrárias que violam os direitos humanos e processos politizados — inclusive contra o ex-presidente Jair Bolsonaro".

Após o anúncio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se solidarizou com Moraes e afirmou que é "inaceitável a interferência do governo norte-americano na Justiça brasileira".

Aprovada durante o governo de Barack Obama, em 2012, a Lei Magnitsky foi criada para punir autoridades russas envolvidas na morte do advogado Sergei Magnitsky, que denunciou um esquema de corrupção estatal e morreu sob custódia em Moscou.

CEO do Hermitage Capital Management, Browder foi o maior investidor estrangeiro na Rússia até 2005, quando foi proibido de entrar no país e incluído na lista negra do governo russo como uma "ameaça à segurança nacional".

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Fim do Que História!

Magnitsky, que era o advogado de Browder em Moscou, morreu na prisão em 2009, após ser acusado de fraude fiscal e condenado a 11 meses de prisão.

"Então fui a público para tentar encontrar uma maneira de fazer justiça por Sergei Magnitsky", lembra Browder.

Ele conta que muitas das pessoas envolvidas na morte do advogado lucraram com o crime e mantinham seu dinheiro no exterior.

Então Browder teve a ideia de congelar os bens e proibir viagens dessas pessoas aos EUA, o que levou à criação da lei, posteriormente ampliada para poder ser aplicada a violadores de direitos humanos de outros países, para além da Rússia.

Para Browder, o uso da Lei Magnitsky por Trump contra Moraes pode ter consequências graves, comprometendo a integridade da lei e tornando-a passível de ser questionada nos casos em que ela foi legitimamente aplicada.

Mas ele também avalia que há grandes chances de a decisão ser revertida pela Justiça, diante do flagrante uso da lei em desacordo com sua intenção original.

"Acredito que há fortes argumentos para que a decisão seja anulada pelos tribunais", diz Browder, que tem dois livros publicados no Brasil: Ordem de Bloqueio (2022) e Alerta Vermelho (2016), ambos lançados pela editora Intrínseca.

"A lei não foi usada como foi originalmente concebida. E há a oportunidade para que este juiz [Alexandre de Moraes] recorra aos tribunais para reverter isso."

Confira abaixo os principais trechos da entrevista.

BBC News Brasil - Por que o senhor discorda do uso da Lei Magnitsky contra o juiz Alexandre de Moraes?

Bill Browder - Porque a Lei Magnitsky foi estabelecida para impor sanções a graves violadores dos direitos humanos e pessoas que são culpadas de cleptocracia em larga escala [quando governantes e autoridades usam sua posição para enriquecer de forma corrupta].

Ela não foi criada para ser usada para resolver vinganças políticas.

O uso atual da Lei Magnitsky é puramente político e não aborda as questões de direitos humanos para as quais ela foi originalmente elaborada. E, como tal, é um abuso das intenções da Lei Magnitsky.

BBC News Brasil - O senhor pode explicar um pouco mais sobre o contexto da criação da lei e suas intenções originais ao defendê-la?

Browder - Sergei Magnitsky foi meu advogado russo que descobriu um grande esquema de corrupção do governo russo em 2008.

Ele expôs isso. Ele testemunhou contra os oficiais envolvidos. E, em retaliação por ter feito isso, ele foi preso. Ele foi sistematicamente torturado na prisão e foi assassinado aos 37 anos, após 358 dias de tortura extrema.

Sergei Magnitsky

Crédito,Wikimedia Commons

Legenda da foto,Sergei Magnitsky, advogado de Bill Browder na Rússia, morreu na prisão em 2009, após denunciar um esquema de corrupção estatal

O governo russo, incluindo o próprio Vladimir Putin, se fechou em defesa própria e se recusou a responsabilizar alguém pelo assassinato.

Então fui a público para tentar encontrar uma maneira de fazer justiça por Sergei Magnitsky.

E a maneira que decidi fazer justiça foi que muitas das pessoas envolvidas no assassinato dele eram pessoas que lucraram muito com aquele assassinato e mantiveram o dinheiro no exterior.

E então tive a ideia de congelar seus bens e proibir viagens deles aos Estados Unidos. E apresentei isso aos senadores do Partido Republicano e do Partido Democrata. E isso eventualmente foi aprovado. Se chama Lei Magnitsky e foi aprovada por 92 votos a 4 em 2012.

Se tornou uma lei federal durante o governo do presidente Obama. Desde então, ela foi ampliada não apenas para a Rússia, mas também para violadores de direitos humanos estrangeiros em outros países. E ao longo dos anos, ela foi usada em vários casos muito importantes.

BBC News Brasil - O senhor pode dar exemplos?

Browder - Por exemplo, as autoridades chinesas que estiveram envolvidas no genocídio uigur, que organizaram campos de concentração em Xinjiang.

Foi usado contra as autoridades de Mianmar envolvidas no genocídio dos Rohingya em Mianmar.

Ela foi usada contra forças de segurança e indivíduos na Nicarágua que abriram fogo contra manifestantes estudantis pacíficos.

Campo de trabalho forçado em Xinjiang
Legenda da foto,Lei Magnitsky foi aplicada contra autoridades chinesas que organizaram campos de concentração em Xinjiang (foto)

Ela tem sido usada em casos em que há evidências claras, absolutas e contundentes de abusos de direitos humanos, e tem sido usada como uma forma de as vítimas obterem justiça, o que elas não conseguiriam de outra forma.

O uso atual da Lei Magnitsky pelos Estados Unidos contra um juiz envolvido em um processo contra um ex-político, no qual os Estados Unidos disseram claramente que estão irritados porque esse ex-político está sendo processado, não é um uso apropriado da Lei Magnitsky, e é uma deturpação de suas intenções originais.

BBC News Brasil - Essa é a primeira vez que a lei foi mal utilizada ou houve alguma ocasião anterior em que isso ocorreu, que seja do seu conhecimento?

Browder - Nunca vi a lei sendo mal utilizada até agora.

BBC News Brasil - Na sua avaliação, quais são as consequências desse uso indevido da lei pelo presidente Donald Trump?

Browder - Bem, isso simplesmente compromete a integridade da lei. A lei teve imensa credibilidade em envergonhar pessoas que fizeram coisas ruins.

E se de repente ela estiver sendo abusada e usada para vinganças políticas, então isso tira a credibilidade dos outros casos em que indivíduos sofreram sanções.

Donald Trump

Crédito,EPA/Shutterstock

Legenda da foto,Para Bowder, uso da Lei Magnitsky por Trump contra Moraes é 'puramente político e não aborda questões de direitos humanos'

BBC News Brasil - Como o senhor se sente pessoalmente em relação a essa situação atual, tendo dedicado tanto do seu tempo e energia para essa causa?

Browder - No geral, a Lei Magnitsky não foi aprovada apenas nos Estados Unidos, mas em outros 35 países ao redor do mundo, e continuará sendo uma das ferramentas mais importantes usadas em prol das vítimas de ataques aos direitos humanos.

Mas acho decepcionante que os Estados Unidos façam isso.

BBC News Brasil - É possível que as sanções impostas a Moraes sob a Lei Magnitsky sejam anuladas, seja por meios judiciais ou por uma futura administração após a de Trump?

Browder - Acredito que há fortes argumentos para que a decisão seja anulada pelos tribunais.

A lei não foi usada como foi originalmente concebida. E há a oportunidade para que este juiz [Alexandre de Moraes] recorra aos tribunais para reverter isso.

BBC News Brasil - Já houve alguma reversão antes?

Browder - Ela não foi revertida antes porque não houve abuso da Lei Magnitsky antes. Todos que sofreram sanções antes sofreram sanções adequadamente.

Alexandre de Moraes

Crédito,Reuters

Legenda da foto,'Acredito que há fortes argumentos para que a decisão [contra Alexandre de Moraes] seja anulada pelos tribunais', diz Browder

BBC News Brasil - E o senhor acredita que isso pode ser feito nos EUA ou em tribunais internacionais?

Browder - É uma lei americana e pode ser anulada pelos tribunais dos Estados Unidos. E o Poder Judiciário é um poder independente do Poder Executivo.

Então, independentemente do que o presidente [Donald Trump] e seu governo querem, se ficar claro que ele [Moraes] foi injustamente punido com sanções e que a lei foi abusada, então ele tem meios legais para reverter isso.

BBC News Brasil - Depois da sua publicação no X criticando o uso da lei Magnitsky contra Moraes, muitos apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro o criticam por supostamente não entender o contexto brasileiro bem o suficiente para comentar. Como o senhor responde a essas críticas?

Browder - Bem, antes de mais nada, a maioria das pessoas que responderam não são pessoas reais.

Como você sabe, Elon Musk, dono da X, é um grande crítico do juiz [Alexandre de Moraes] porque o juiz tentou calá-lo.

Então eu nem acredito que essas pessoas estejam me criticando de verdade. Não tenho resposta para bots que fazem declarações falsas.