SABERES TRANSDISCIPLINARES E ORGÂNICOS.

terça-feira, 26 de agosto de 2025

A Agonia do Bem na Palestina : O mundo da Ingratidão, Perseguição, indiferenças, maldades e corrupção contra crianças, mães, jornalistas...

 


Há uma dor que transcende o sofrimento físico, uma ferida da alma que sangra não pelo que foi feito, mas pelo que foi recebido em troca. É a angústia silenciosa de quem, movido por um impulso de genuína bondade, estende a mão e tem os dedos esmagados pela ingratidão, pela calúnia e pela perseguição como faz hoje o Governo de Israel contra inocentes. Esta é a crucificação moderna do caráter, um martírio onde a recompensa pelo sacrifício é a acusação injusta.

A literatura, espelho da condição humana, está repleta dessas vítimas nobres. Em Shakespeare, encontramos a figura arquetípica do homem injustamente acusado em Rei Lear.
, banido por sua honestidade, serve ao seu rei disfarçado, suportando insultos e humilhações, movido apenas por uma lealdade pura e não reconhecida. Sua recompensa é continuar a servir, sua dor, a invisibilidade de seu valor. Já em Otelo, é Iago quem personifica o veneno da acusação falsa, destruindo a honra de Desdêmona, cujo único "crime" foi a virtude e a inocência que não conseguiu defender contra a narrativa perversa de outrem.

Charles Dickens, o cronista da injustiça social, pintou este tormento com cores vivas. Oliver Twist, a criança pura em um mundo de adultos corrompidos, é constantemente punido por sua própria inocência, acusado de um mal que sua natureza sequer consegue conceber. A sua luta não é apenas por um pedaço de pão, mas pelo reconhecimento de sua bondade intrínseca em um universo que a confunde com fraqueza ou malícia.


Contudo, é talvez em O Conde de Monte Cristo, de Alexandre Dumas, que encontramos a mais catártica exploração desta dor. Edmond Dantès não é apenas um homem que sofre uma injustiça; ele é a personificação da ruína do homem bom. Traído pelos que considerava amigos, acusado de um crime que não cometeu, e jogado nas masmorras mais escuras pelo ciúme e pela ambição alheios, sua alma é sistematicamente despedaçada. A sua transformação no vingativo Conde de Monte Cristo é a prova definitiva de que a injustiça não fere apenas – ela deforma, corrói e envenena a própria essência do bem.

Liev Tolstói, em Anna Karenina, nos apresenta outra faceta: a perseguição social. A personagem-título é acusada e banida não por um crime legal, mas por ter desafiado as hipócritas convenções de uma sociedade que tolera o mesmo comportamento em homens, mas crucifica uma mulher por ele. Seu sofrimento é a agonia de ser julgada e condenada por um tribunal sem juízes nomeados, mas com veredictos implacáveis.

Esta dinâmica não é apenas literária; é um arquétipo profundamente enraizado na história e na espiritualidade humanas. A tradição bíblica está alicerçada nesta narrativa. Jó, o homem "íntegro e reto", é submetido ao sofrimento extremo não por um pecado, mas como um teste à sua fé. Seus amigos, em uma cruel ironia, tornam-se seus acusadores, argumentando que seu sofrimento deve ser uma punição por alguma falha oculta. A dor de Jó é amplificada pela incompreensão e pelas acusações infundadas daqueles que deveriam confortá-lo. O próprio Cristo, o epítome do bem, foi acusado, traído, humilhado e crucificado entre criminosos. A imagem do justo sofrendo o destino do malfeitor é o cerne do drama cristão.

Na Cabala Judaica, a ideia do Tikkun Olam (o reparo do mundo) implica em um trabalho altruísta, muitas vezes anônimo e não reconhecido, para elevar as centelhas divinas. O cabalista age pelo bem maior, não pela gratidão, entendendo que a recompensa está no ato em si, no reequilíbrio cósmico, mesmo que isso signifique suportar a incompreensão e a escuridão (o Klipot) que se opõe à sua obra. A dor do justo é parte do contra-peso necessário para redenção universal.

E a história não ficou imune a este fenômeno. O grito de Émile Zola, "J’Accuse…!", ecoa como o supremo exemplo moderno do intelectual assumindo um enorme risco pessoal para fazer o bem. Ao defender o capitão Alfred Dreyfus, injustamente acusado de traição, Zola não buscou gratidão. Pelo contrário: ele se colocou deliberadamente na linha de fogo. Sabia que seria difamado, perseguido, processado e exilado. Sua carta aberta foi um ato de puro bem, que lhe rendeu ódio, violência e a condenação de uma nação intoxicada pelo preconceito. Zola tornou-se um Dantès real, usando sua pena não para vingança, mas para justiça, e pagando um preço
altíssimo por isso.


Fazer o bem e ser punido por isso é, portanto, uma das experiências mais desorientadoras e dolorosas. É um terremoto que abala os alicerces da nossa fé na justiça e na reciprocidade. A literatura, a religião e a história nos mostram que este é um caminho tristemente comum. Mas também nos oferecem um fio de esperança: a de que, no grande tribunal da história e da consciência, a verdade, por mais que seja perseguida e caluniada, eventualmente emerge. A vindicação de um Dantès, a redenção de um Oliver Twist, e a reabilitação póstuma pleiteada por um Zola servem como lembrete solene de que, embora a gratidão humana seja falha e a justiça humana, cega, o ato de fazer o bem carrega em si um valor intrínseco que nenhuma acusação injusta pode jamais manchar completamente. A dor é real e profundamente humana, mas a integridade de ter agido corretamente sobrevive à crueldade do mundo.





Nenhum comentário:

Postar um comentário