SABERES TRANSDISCIPLINARES E ORGÂNICOS.

terça-feira, 19 de agosto de 2025

Sobre a ganância e a manipulação na Bíblia e na Cabala judaica .

 


Querer igual ao outro, interditando ou eliminando a opção de tomar o que é do outro, tornou-se uma forma de poder humano. Já a cobiça vem do modelo de estar entre cabeças de raposas, capitaneando espertezas. Lubridiada pela sensação de estar na dianteira, na cabeça, a força se perde no labirinto das raposas, da esperteza. 

A história começa com um homem andando pelo campo com uma moringa (vasilha) de leite quando encontra uma cobra faminta. A cobra, ao ver o leite, pede ao homem que lhe dê um pouco. O homem, com pena, oferece o leite, e a cobra, em troca, promete levá-lo a um lugar onde há muito dinheiro. O homem aceita e a cobra o guia até uma pedra. Debaixo da pedra, o homem encontra uma fortuna e a recolhe. 

No entanto, a cobra, aproveitando-se da confiança do homem, tenta estrangulá-lo, alegando que ele estava roubando seu dinheiro. O homem, desesperado, clama por ajuda e encontra Salomão, que questiona ambos sobre o ocorrido. A cobra explica sua versão, e o rei, com sua sabedoria, pergunta ao homem como a cobra estava no momento em que ele ofereceu o leite. O homem explica que a cobra estava enrolada em seu pescoço. Salomão então pergunta como a cobra estava sob a pedra, e o homem responde que estava enrolada também. Salomão, percebendo a astúcia e a ingratidão da cobra, decide que a serpente não merece a ajuda que recebeu e ordena que o homem a esmague.



Não importa como arrebatadora possa ser a serpente, mesmo a melhor delas, não se deve embarcar no seu canto de sereia, ela quer nos tirar de nossa potência de força. A advertência é para que resistamos a subjetividade da cobiça. Como se faz isso? De súbito de um salto para o lado e esmague a cabeça da cobra. Esta é a essência do conselho bíblico em Gênesis, quando Deus adverte Caim: "O pecado jaz à sua porta; ele deseja conquistar-te, mas tu deves dominá-lo" (Gênesis 4:7). A cobra da cobiça sempre estará à porta, e o salto para o lado é o ato consciente de dominá-la, de não se deixar seduzir pela sua narrativa distorcida.


Ninguém depende tanto do outro quanto aquele que busca a glória. Rabi Levi disse: os demais Rios perguntaram ao Eufrates “Por que o seu som é quase inaudível?” respondeu: “Não preciso de um som alto; os meus feitos me tornam conhecidos. Quando uma simples muda de árvore é plantada ao meu lado, se torna robusta em 3 dias.” Então os outros Rios perguntaram ao Rio Tigre: “Por que o seu som é tão audível?” Ao que o rio respondeu: “Eu gostaria que até meu som fosse mais audível para que as pessoas repararem mais em mim.” 

Já a honra depende de colocarmos os outros acima de nós, ou seja, a fama afasta uma pessoa da realidade, enquanto a honra localiza um indivíduo e o aproxima da realidade. Esse é um paradoxo que faz criança cheio de privilégio de conhecer a fraqueza do mimo, em animais paparicados viverem debilidade da domesticação, e pessoas que viverem em abundância sofrerem a atonia da depressão. Esta "atonia da abundância" é a síndrome do Rei Midas, que da mitologia grega, ganhou o poder de transformar tudo em ouro, apenas para descobrir que sua riqueza era uma maldição que o privava do abraço da filha e do sabor do pão. Seu toque, movido pela ganância, tornou-se o instrumento de sua própria prisão e solidão. 

A literatura está repleta dessas armadilhas da cobiça. No coração de Macbeth, de Shakespeare, a profecia das bruxas é o canto da sereia que seduz o nobre general. Impulsionado pela ambição de sua esposa e pela própria cobiça pelo trono, Macbeth mergulha num labirinto de traição e assassinato. Ele acredita estar capitaneando espertezas, mas, como previsto, perde toda a sua "força no labirinto das raposas". A coroa conquistada torna-se um peso insuportável, levando-o à loucura e à ruína, provando que o poder usurpado pela ganância é um poder corrompido e autodestrutivo.


 

No mundo real, a história se repete incessantemente. Figuras como a de Madoff, tornam-se arquétipos modernos da manipulação. Durante décadas, ele capitaneou a esperteza, tecendo uma rede de confiança com o único objetivo de cobiçar e devorar o patrimônio alheio. Seu esquema de Pirâmide foi um longo "canto de sereia" que arrebatou milhares, prometendo riquezas fáceis. No fim, a serpente foi esmagada pela justiça, mas não antes de causar um rastro de devastação, uma prova vívida de que o labirinto da esperteza leva apenas ao abismo. 

A sabedoria bíblica oferece o antídoto final para essa condição humana. O apóstolo Paulo, em sua carta a Timóteo, sintetiza o salto para o lado que devemos dar: "De fato, a piedade com contentamento é grande gain. Porque nada trouxemos para este mundo e dele nada podemos levar; por isso, tendo o que comer e com que vestir-nos, estejamos com isso satisfeitos. Os que querem ficar ricos caem em tentação, em armadilhas e em muitos desejos descontrolados e nocivos, que levam os homens a mergulharem na ruína e na destruição, porque o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males" (1 Timóteo 6:6-10). A verdadeira fortuna, portanto, não está sob a pedra guiada pela cobra, mas na potência de força de quem sabe se contentar e dominar o pecado que jaz à porta. 



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