SABERES TRANSDISCIPLINARES E ORGÂNICOS.

terça-feira, 17 de junho de 2025

O Eu e os Outros (sobre a conexão entre o autoaperfeiçoamento e o impacto no coletivo)

 

Refletir sobre o autoaperfeiçoamento me levou a uma verdade cada vez mais clara: toda transformação verdadeira começa por dentro. Dentro de cada um de nós.

Aldous Huxley escreveu: “Existe apenas um canto do universo que você pode ter certeza de melhorar, e esse é o seu próprio eu.” Na verdade, não dá pra mudar o mundo sem antes mudar a si mesmo. Eu gosto dessa ideia, ela nos obriga a inverter a direção do olhar. Em vez de projetar soluções para fóruns, estruturas para problemas distantes ou globais, ela nos chama à responsabilidade íntima. É mais fácil culpar o mundo por transformar hábitos, confrontar feridas ou rever posturas. Mas é justamente esse trabalho silencioso, quase invisível, que sustenta qualquer mudança verdadeira — a que resiste ao tempo e ao caos.

Isaac Asimov comentou: "Autoeducação é, eu acredito firmemente, o único tipo de educação que existe. A única função de uma escola é tornar a autoeducação mais fácil; caso contrário, ela não faz nada." Essa frase tira a centralidade das instituições e atribui o protagonismo ao indivíduo. Aprender, nesse contexto, não é um processo passivo, mas uma escolha ativa, constante. Não basta receber conteúdos — é preciso absorvê-los com autonomia, questioná-los, conectá-los à experiência. A verdadeira educação, então, não é aquela que nos molda, mas a que nos liberta para pensar por conta própria. A forma como escolhemos aprender — com liberdade, profundidade e curiosidade — é o que mais transforma nossa visão de mundo e nossas escolhas.

Edward Gibbon também escreveu: “Todo homem recebe duas educações: a que lhe dá e a que ele mesmo dá; esta última é a mais importante.” A segunda educação, que Gibbon destaca, é muitas vezes silenciosa e invisível. Ela acontece nas escolhas do dia a dia, nas perguntas que nos permitimos fazer, nos livros que buscamos por curiosidade óbvia, e até nos erros que nos forçam a crescer. É uma educação que não depende de diploma, mas de presença e persistência interior. E talvez por isso seja tão transformadora — porque ela nos constitui por dentro. No fim das contas, é o que a gente faz com o que aprende que realmente é importante.

Autoaperfeiçoar-se é mais do que um projeto pessoal: é um motor silencioso de transformação coletiva. Quando uma pessoa escolhe crescer, isso respinga nos outros, nas relações, nos espaços. O coletivo não é uma entidade à parte — é a soma de cada um de nós.

Mas a via é de mão dupla. O coletivo também molda, influencia e, por vezes, limita. Normas engessadas, pressões culturais e expectativas podem nos salvar das perdas. E quando nos afastamos de nós mesmos, o grupo também empobrece. Afinal, um coletivo só floresce quando há verdade em cada voz.

Ainda assim, o coletivo não é o vilão. Pelo contrário: pode ser um terreno fértil, desde que sustentado por indivíduos conscientes. Sem essa base, corre o risco de se tornar um espaço de reprodução e estagnação. Mas com pessoas em busca de crescimento, ele vira impulso, abrigo e multiplicador de ideias.

Por isso, não vejo essa relação como um equilíbrio delicado, mas como uma ordem de influência: o indivíduo vem antes. Ele é a raiz que nutre o todo. Quando o coletivo deixa de apoiar a evolução pessoal, perde a chance de se renovar.

Acredito que o indivíduo transformado é quem planta, de fato, as sementes de uma sociedade mais justa, lúcida e viva. O autoaperfeiçoamento é uma força silenciosa que atravessa o íntimo, toca o outro e alcança o mundo. E é ali, nesse caminho de dentro para fora, que a verdadeira mudança acontece.

Mas vale lembrar: o autoaperfeiçoamento não é sinônimo de perfeição. Não se trata de virar alguém idealizado, mas de se comprometer com um processo constante. Crescer dói, exige confrontar zonas de conforto, rever ideias fixas, encarar contradições… Se olhar bem no espelho, sob a luz forte da realidade. E ainda assim, é um caminho que vale a pena. Porque cada passo sincero nesse processo nos torna mais inteiros — e menos dependentes de validações externas.

Isso também nos prepara melhor para lidar com o mundo. Um indivíduo que se conhece tem mais clareza para fazer escolhas, mais firmeza para dizer “não” ao que fere sua integridade, e mais generosidade para conviver com as diferenças. O crescimento pessoal não é isolado, ele amplia.

Além disso, ao observar o próprio processo, acabou por ter mais paciência com os outros. Entendemos que ninguém floresce à força e que cada um tem seu tempo. Isso muda a forma como participamos do coletivo: saímos da lógica da imposição e entramos na escuta, na troca, no exemplo silencioso.

Autoaperfeiçoar-se, então, não é só um dever seguir o mesmo, mas um ato de responsabilidade social. Porque, no fim, somos todos atravessados pelos outros. Ninguém vive ou cresce sozinho. Mas é preciso iniciar o movimento. A mudança começa em nós, mas não termina aí.

Se o mundo anda áspero, talvez seja porque faltam mais pessoas dispostas a olhar pra dentro com honestidade e coragem. Não pra se tornarem superiores, mas mais conscientes. Mais inteiras. Mais vivas. Mais honesto. Mais interessados.

Nenhum comentário:

Postar um comentário