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segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Amor e Vontade: Uma Jornada entre o Desejo, a Sombra e a Intencionalidade por Egidio Guerra



O amor e a vontade não são simples emoções ou impulsos; são forças profundas que moldam a existência humana. Através das lentes de Sigmund Freud, Carl Jung e Rollo May, podemos traçar um mapa da psique que vai do impulso reprimido até a expressão criativa e equilibrada do eros.

A Base Freudiana: Eros, Thanatos e a Repressão 

Para Sigmund Freud, a vida psíquica é uma dinâmica constante entre Eros (o instinto de vida, que inclui a sexualidade e o impulso para a união) e Thanatos (o instinto de morte, que busca a dissolução e a agressão). O eros freudiano é, antes de tudo, uma pulsão biológica, uma energia bruta e poderosa que busca descarga. 

repressão é o mecanismo fundamental da civilização. Para vivermos em sociedade,我们必须 reprimir nossos desejos instintivos mais primitivos. Essa repressão não é intrinsecamente patológica; é necessária. No entanto, quando é excessiva ou mal resolvida, leva às neuroses: a energia do eros é bloqueada e encontra saídas distorcidas, como ansiedades, fobias e comportamentos compulsivos. A sexualidade, assim, deixa de ser uma expressão de prazer e conexão e se torna um campo minado de conflitos inconscientes. 

A Visão Junguiana: Eros como Conector e a Sombra 

Carl Jung expandiu radicalmente o conceito de Eros. Para ele, Eros não é apenas sexualidade, mas o princípio de conexão por excelência. É a força que busca relacionamento, união, síntese e significado. É o arquétipo que rege não apenas o amor romântico, mas também a compaixão, a criatividade e a conexão com o mundo. 

O grande perigo, na visão de Jung, é a repressão da nossa Sombra – a parte de nossa psique que contém tudo o que negamos em nós mesmos: nossos desejos "inaceitáveis", nossa raiva, nossa sexualidade "selvagem". Quando não integramos nossa Sombra, projetamos suas características nos outros ou ela explode de forma autodestrutiva. A relação com o sexo pode se tornar patológica quando: 

  • É dissociada do amor: O sexo vira puro instinto, desprovido de significado relacional (uma expressão da Sombra não integrada). 

  • É excessivamente espiritualizada: O aspecto corporal e instintivo do eros é negado, criando uma divisão entre o "sujo" (corpo) e o "puro" (espírito). 

A Síntese de Rollo May : Amor e Vontade como Cura 

Rollo May une e transcende Freud e Jung. Em seu livro "Amor e Vontade", ele diagnostica o mal-estar do homem moderno: a repressão não do desejo, mas da vontade. Vivemos uma era de apatia, onde as pessoas se sentem impotentes para afetar seu próprio destino. 

May define: 

  • Amor: A experiência de reconhecer e regozijar-se com a existência do outro. Não é apenas um sentimento, mas um encontro que nos confronta com outra consciência. O eros é a fome pela união, mas uma união que preserva a individualidade. 

  • Vontade: Não é força bruta, mas a capacidade de organizar a si mesmo para mover-se em uma determinada direção. É a intencionalidade consciente. 

Para May, o amor sem vontade é sentimentalismo vazio. A vontade sem amor é manipulação e controle. O equilíbrio surge quando usamos nossa vontade para nos dirigirmos em direção ao outro de forma autêntica e comprometida (amor). 


As Patologias na Relação com o Sexo: O Caso do Narcisismo 

É nesse desequilíbrio entre amor, vontade e eros que as patologias florescem. O narcisismo é a patologia arquetípica do nosso tempo. 

  • Freud o veria como uma libido (energia do eros) que, em vez de se dirigir a um objeto externo (outra pessoa), ficou estagnada no próprio ego. O narcisista ama a si próprio no outro, e não o outro em si. 

  • Jung diria que o narcisista está identificado com a persona (a máscara social idealizada) e completamente alienado de sua Sombra. Ele não consegue verdadeira conexão (eros) porque não se conectou consigo mesmo em sua totalidade. 

  • May argumentaria que o narcisista sofre de uma vontade debilitada. Incapaz de se direcionar genuinamente para o mundo e para o outro, ele recua para o self, onde o controle é total. O sexo, para o narcisista, não é um encontro, mas uma ferramenta de auto-validação e poder, usada para extrair admiração e confirmar sua própria imagem, não para se conectar com a subjetividade do parceiro. 

Outras patologias, como a perversão (a desconexão total entre o ato sexual e a relação humana) e a apatia sexual (a morte do desejo), também são frutos da incapacidade de integrar o instinto (Freud), a conexão (Jung) e a intencionalidade (May). 


O Caminho para uma Vida Equilibrada 

O caminho que o amor e a vontade nos indicam não é de liberação irrestrita dos instintos nem de repressão total. É um caminho de integração e coragem. 

  1. Enfrentar a Sombra (Jung): Equilíbrio começa pelo autoconhecimento. Precisamos olhar com coragem para nossas partes reprimidas, nossos desejos e medos. Integrar a Sombra é recuperar nossa energia vital completa e parar de projetar nossas falhas nos outros. 

  1. Reconhecer e canalizar o Eros (Freud): Entender que a energia sexual é uma força poderosa da natureza humana. Em vez de reprimi-la cegamente ou expressá-la de forma irresponsável, o objetivo é sublimá-la – canalizá-la para formas criativas, relacionamentos profundos e trabalho significativo. 

  1. Cultivar a Vontade Intencional (May): Desenvolver a capacidade de fazer escolhas conscientes e assumir a responsabilidade por elas. É usar a vontade para dizer "sim" a um compromisso e "não" a uma distração. No amor, é a decisão diária de se dirigir ao outro, de estar presente e de trabalhar pela relação. 

  1. Unir Amor e Vontade: O ápice do equilíbrio é a ação amorosa e intencional. É o eros expresso não como pura carência ou busca de prazer, mas como um encontro deliberado entre duas vontades que se escolhem mutuamente. O sexo, nesse contexto, se torna a linguagem corporal desse encontro – uma celebração de conexão, prazer e mutualidade. 

Em última análise, a jornada do amor e da vontade nos leva de uma vida de reação e conflito para uma vida de autoria e significado. É a coragem de abraçar toda a nossa humanidade – instinto, coração e espírito – e usá-la para construir pontes autênticas com o mundo e com os outros. 

 

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