SABERES TRANSDISCIPLINARES E ORGÂNICOS.

domingo, 21 de setembro de 2025

Habitante de um pequeno grão de terra à Terra da sabedoria por Egidio Guerra.

Sabedoria é viajar pela estrada da morte ainda vivo, ir, sem morrer, para onde os mortos vão. É empreender a jornada descrita por Parmênides de Eleia, que em seu poema filosófico é conduzido pelas filhas do Sol para além dos "portões dos caminhos da Noite e do Dia", para receber da Deusa a revelação da Verdade imutável. Aqueles que sabem o que os outros não sabem são justamente os que ousaram percorrer esse caminho. Por causa daquilo que sabem, são capazes de ir onde outros não iriam, guiados não pelo medo, mas pelos caminhos da sabedoria. 

Eles são, por fim, recebidos com muita bondade e afeto pela Deusa da Justiça (Dike, para os gregos, ou Themis, a divina ordem), porque buscaram a harmonia com a lei fundamental do cosmos. Cortar algo de suas raízes é claro que deixará de ter vida. A busca pela sabedoria, portanto, não é um acréscimo, mas a busca para encontrar seu próprio vínculo com o divino, a raiz última de nosso ser. Como ensinavam os mistérios antigos, a iniciação era descobrir como você se relaciona com Deus, saber como você pertence a Ele, saber que você está em casa ali quanto está em casa aqui. É ser adotado como filho de Deus, reconhecendo a centelha eterna dentro de si. 

Todos fogem da morte, portanto todos fogem da sabedoria, exceto aqueles que estão dispostos a pagar o preço e nadar contra a correnteza do mundo, contra a doxa (a opinião ilusória) contra a qual Parmênides nos alertou. Não existe nada mais indigno do que nos esquecermos da nossa grandeza essencial – nossa capacidade de conhecer o Verdadeiro, o Bem e o Belo – e nos agarrarmos a qualquer outra coisa efêmera. 

Os conhecimentos técnicos que temos recebido sem sabedoria não funcionam mais, e muito tempo atrás nós jogamos fora as instruções de como usá-los, o manual da alma que nos foi dado pelos mitos, pelos filósofos e pelos sábios. Não podemos entrar no futuro deixando o passado para trás. Só podemos avançar para o futuro se nos voltarmos para nosso passado, resgatando a tradição sapiencial, e nos tornarmos quem verdadeiramente somos, cumprindo o imperativo délfico: "Conhece-te a ti mesmo". 

Às vezes, a coisa mais sábia é permitir que outros nos enganem e prometam nos amar até que o ferro flutue no rio, pois a sabedoria também é discernimento para escolher as batalhas e compreender a leveza irônica da existência, como faria um Sócrates ao dialogar com os pretensos sábios de Atenas. 

É enxergar além da superfície e das aparências, interpretando os enigmas da existência. É seguir o caminho do herói, como Héracles ou Odisseu, fundar terras e mapas da sabedoria do bem, do belo e do justo, viver nossos suplícios, sofrimentos e transformações para, enfim, encontrar o propósito espiritual e da existência: o amor à sabedoria, a filosofia em seu sentido mais puro. 

Andamos com um buraco dentro de nosso coração, uma saudade (saudade, do latim solitatem), uma solidão ontológica. E nesse buraco, nesse vazio, está todo o universo. A tarefa final do sábio é, parando a agitação do mundo, observar e ouvir o universo e esperar, com paciente reverência, que as coisas revelem seu sentido sagrado, de um pequeno grão de terra à própria Terra da Sabedoria. 

 

Um comentário:

  1. MARCELO DOS SANTOS FORTUNA22 de setembro de 2025 às 06:36

    "Conhece-te a ti mesmo" é a condição basilar pra seguirmos adiante levando conosco nosso espírito e as mínimas condições de seguirmos em frente de forma construtiva, a caminho da luz. Reconhecer nossa pequenez diante do Universo e reconhecermos que somos o próprio Universo é um desafio. Nossa imortalidade a caminho da angelitude anda de mais dadas com a misericórdia do Pai. Estamos encarnando aqui personagens necessários para nosso adiantamento, mas sob o olhar de Deus, que coloca o amor em sua pedagogia. Conhecer a morte nada mais é que conhecer a vida, pois ela não existe. Caio o corpo cansado e liberta-se o espírito, graças a Deus.

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