Chega sem aviso, rompe o equilíbrio,
Um golpe no ar que não vimos vir.
Não há escudo que o peito fabrique
Para a violência que faz sucumbir.
Não nos preparam para a desigualdade,
Para o frio olhar da indiferença cruel.
A corrupção que corrói a cidade,
O egoísmo que nega o céu.
E temos que perdoar — eis o mistério —
Mesmo com cicatrizes a doer.
Carregamos conosco o hemisfério
De uma dor que não pode morrer.
Como ser melhor no amor e na dor
Neste mundo que insiste em ferir?
Como encontrar Deus, sonhos, calor
Onde muitos só querem partir?
A justiça parece um rio distante,
A ética murcha sob o poder.
O mundo insensível, arrogante,
Prefere não ver, não saber.
Mas Dostoiévski nas sombras clama,
Shakespeare no verso expõe a paixão.
Victor Hugo acende a chama,
Camus questiona a condição.
Eles não negam a dor, a queda,
Mas na escuridão deixam um fio de luz:
A esperança ainda é semente que enreda
Os que creem no humano — eis a cruz.
Cultivar o bom gesto, simples e raro,
Em meio ao desprezo e ao rumor.
Ser abrigo no temporal amaro,
Guardar fé no mais puro amor.
Que cada ato bom, por menor,
Seja uma estrela a perfurar o véu.
Nesta sociedade de tanto horror,
Ainda podemos sonhar — é o céu.
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