ESTOCAR VENTO
O tema que viralizou em 2015, tirado de um discurso da então presidenta Dilma Rousseff na Assembleia-Geral da ONU, sobre a necessidade de se desenvolver tecnologia para "estocar vento", transformou-se em um dos memes políticos mais duradouros do Brasil, servindo por anos como um símbolo de suposta falta de domínio técnico ou de desorganização do discurso.
Contudo, o tempo não só suavizou a piada, mas também, ironicamente, começou a dar razão à essência do que a ex-presidenta tentava expressar.
A polêmica nasceu de uma simplificação e, talvez, de uma escolha de palavras infeliz, mas o conceito por trás da frase, que era a necessidade de armazenamento de energia proveniente de fontes intermitentes como a eólica (vento) e a solar, provou ser uma das questões mais urgentes e importantes da transição energética global.
Dilma não estava propondo guardar o ar em sacos, mas sim que o mundo precisava de tecnologias eficientes, como baterias de larga escala ou outros métodos de conversão, para guardar o excedente de energia gerada quando o sol está forte ou o vento está soprando.
A energia eólica e a solar, apesar de limpas, são intermitentes.
A eletricidade que elas geram é instável, dependendo das condições climáticas, o que pode causar desequilíbrios na rede de distribuição e, em casos extremos, apagões.
O desafio tecnológico de "estocar vento e sol", portanto, é fundamental para garantir a segurança energética e a estabilidade dos sistemas elétricos que dependem cada vez mais dessas fontes renováveis.
Dez anos depois da declaração, o tema do armazenamento de energia é uma das áreas que mais recebe investimentos e inovações no setor.
Empresas e países investem bilhões no desenvolvimento de baterias mais baratas e potentes, em hidrogênio verde, e em outras soluções que efetivamente permitem guardar o que a natureza oferece.
A própria Dilma Rousseff, agora presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (Banco dos Brics), tem reiterado a validade de sua observação, destacando que essa é uma das áreas mais importantes para resolver problemas de instabilidade na rede elétrica, citando inclusive blecautes em países europeus com alta penetração de energia eólica e solar.
A queda dos preços das baterias de íons de lítio e o avanço de outras tecnologias de armazenamento (como o "ar comprimido") estão tornando a "profecia" de Dilma uma realidade técnica e economicamente viável.
O episódio se torna, assim, um paradoxo da comunicação e da tecnologia: uma ideia complexa e essencial foi ridicularizada por sua metáfora literal, mas o princípio científico por trás dela se consolidou como uma prioridade global.
A história da frase "estocar vento" serve como um lembrete cáustico sobre como o debate público muitas vezes prioriza a sátira imediata em detrimento da visão de longo prazo em questões de ciência e infraestrutura.
O que você pensa sobre a forma como o debate público simplifica questões técnicas complexas?
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