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segunda-feira, 13 de outubro de 2025

A Destruição Criativa: Uma Ponte entre Schumpeter, Piketty, Democracia e o Prêmio Nobel no Século XXI por Egidio Guerra



 

O livro "The Power of Creative Destruction: Economic Upheaval and the Wealth of Nations" (2021), dos economistas Philippe Aghion, Céline Antonin e Simon Bunel, é uma obra ambiciosa que serve tanto como homenagem quanto como atualização e extensão das ideias centrais do grande economista Joseph Schumpeter, particularmente as apresentadas em seu livro clássico " Capitalismo, Socialismo e Democracia" (1942)


Para entender a contribuição de Aghion e seus coautores, é essencial primeiro revisitar o núcleo da teoria schumpeteriana. 

O Alicerce Schumpeteriano: "Capitalismo, Socialismo e Democracia" 

No coração da obra de Schumpeter está o conceito de "Destruição Criativa". Ele descreveu este processo como o "fato essencial do capitalismo". Trata-se de: 

  • Um Processo de Revolução Industrial Permanente: O capitalismo não é um sistema de equilíbrio, mas sim de agitação constante. Novas indústrias, tecnologias e métodos de produção surgem, enquanto as antigas são inevitavelmente tornadas obsoletas e destruídas. 


  • O Motor do Crescimento: O progresso econômico não é um processo suave e incremental. Ele é impulsionado por saltos descontínuos, onde a inovação de um empreendedor (o "Líder Schumpeteriano") rompe com o estado estacionário da economia. 


  • O Paradoxo do Sucesso: O mesmo processo que gera riqueza e progresso também gera deslocamento, crise e resistência. Fábricas fecham, empregos desaparecem e comunidades inteiras podem ser afetadas, criando uma tensão inerente no sistema. 

Em "Capitalismo, Socialismo e Democracia", Schumpeter apresentou uma tese provocativa e aparentemente pessimista: o sucesso do capitalismo levaria, paradoxalmente, ao seu próprio declínio e à sua substituição por uma forma de socialismo. Sua lógica era a seguinte: 

  1. A Rotinização da Inovação: A figura do empreendedor heroico seria substituída por grandes corporações com departamentos de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) dedicados. A inovação se tornaria uma tarefa burocrática e previsível, perdendo seu caráter romântico e individual. 


  1. O Erosão dos Pilares Sociais: O sucesso do capitalismo criaria uma classe de intelectuais críticos do sistema que os enriqueceu. Além disso, a destruição de pequenos negócios e a ascensão das grandes corporações minariam o apoio da burguesia ao sistema de propriedade privada. 

  1. A Inevitabilidade do Socialismo: Por fim, um sistema racionalizado e burocrático de controle estatal sobre a economia pareceria mais eficiente e justo, levando a uma transição "suave" para o socialismo. 

"The Power of Creative Destruction": Atualizando e Corrigindo o Rumo 

Aghion, Antonin e Bunel aceitam o diagnóstico de Schumpeter sobre o motor do capitalismo – a Destruição Criativa – mas rejeitam sua prognose sobre o seu fim inevitável. Eles argumentam que Schumpeter subestimou a capacidade do sistema capitalista de se reinventar e a importância crucial do quadro institucional e político que o cerca. 

O livro deles é, portanto, um esforço monumental para usar as ferramentas da economia moderna (modelos teóricos, dados empíricos, estudos de caso) para explorar sob quais condições a destruição criativa funciona para o bem comum, gerando crescimento e bem-estar de longo prazo, e quando ela falha, levando a estagnação, desigualdade e conflito. 


Os Pontos de Diálogo e Evolução Principais: 

  1. Inovação vs. Imitação: A Fronteira Tecnológica e a "Captura" 

  1. Schumpeter focou principalmente na inovação na fronteira tecnológica. Aghion e seus coautores expandem isso, distinguindo entre economias que precisam inovar (países na fronteira, como os EUA) e aquelas que podem imitar e adaptar (países em catch-up, como a China no passado). 


  1. Eles introduzem o conceito crucial de "estado estacionário de captura" (stationary state of capture), onde empresas e setores estabelecidos (os "incumbents") usam seu poder político e econômico para sufocar a inovação e a concorrência, impedindo a destruição criativa. Isso é uma resposta direta à visão de Schumpeter de que os monopólios eram temporários e recompensas necessárias para a inovação. Os autores mostram que, sem um Estado atuante para garantir a concorrência, os monopólios podem se tornar permanentes e paralisantes. 





  1. O Papel do Estado: Não Inimigo, mas Arquiteto 


  1. Enquanto Schumpeter via o Estado com certa desconfiança em sua narrativa de declínio, Aghion et al. colocam-no no centro da análise como um "Estado investidor e facilitador" (enabling state). 

  1. O Estado ideal, para eles, não é aquele que controla os meios de produção (como na previsão socialista de Schumpeter), nem um Estado mínimo. É um Estado que: 

  1. Investe em fatores de inovação de base ampla: Educação, pesquisa fundamental, infraestrutura. 

  1. Projeta e faz cumprir regras do jogo que promovam a concorrência: Leis antitruste fortes, regulamentação que não protege os incumbents. 

  1. Fornece uma rede de segurança: Proteções sociais (seguro-desemprego, requalificação profissional) para amortecer o lado destrutivo do processo, tornando-o social e politicamente tolerável. 



  1. Desigualdade e a "Escada Quebrada" 


  1. Os autores abordam um dos maiores desafios do século XXI: a desigualdade gerada pela inovação. Eles vão além da crítica simples à riqueza dos inovadores. 


  1. Eles distinguem entre uma desigualdade "boa" (quando os inovadores ficam ricos, criando novos mercados e empregos) e uma desigualdade "má" (quando a riqueza vem da captura de renda, herança ou posição de monopólio, sem gerar inovação). 


  1. O perigo real, argumentam, não é a riqueza de Bill Gates ou Steve Jobs, mas a erosão da mobilidade social. Quando o acesso à educação de qualidade e às oportunidades é bloqueado para grandes segmentos da população, a "escada" para subir na economia é quebrada, e o consenso social em torno da economia de mercado se desfaz – ecoando, de forma mais precisa, uma das intuições de Schumpeter sobre o mal-estar social. 



  1. Otimismo Cauteloso vs. Pessimismo Schumpeteriano 


  1. A tese final de "The Power of Creative Destruction" é fundamentalmente mais otimista que a de Schumpeter. O capitalismo não está condenado. 


  1. Seu destino não é uma inevitabilidade histórica, mas uma escolha política e institucional. Podemos escolher construir instituições que promovam a inovação inclusiva, a concorrência dinâmica e uma transição justa para os perdedores do processo de mudança. A alternativa é o estado estacionário de captura, a estagnação secular e o conflito social. 


Conclusão: Um Diálogo Frutífero entre Séculos. Prêmio Nobel para Thomas Piketty 

Economista que revolucionou o debate sobre a concentração de riqueza no mundo discute o papel da ideologia na perpetuação da desigualdade social 

Em O capital no século XXI, Thomas Piketty inflamou o debate em todo o mundo sobre a distribuição de renda e a desigualdade, o que alçou a obra ao status de importante referência da área de economia e uma das mais influentes da atualidade. A partir de discussões fomentadas em palestras, congressos e artigos, Piketty percebeu que uma questão lançada em seu best-seller precisava ser aprofundada: a forma como a ideologia agiu para justificar e perpetrar a desigualdade em todas as sociedades ao longo dos últimos séculos. 

Partindo de uma monumental pesquisa de dados coletados no Ocidente e também em nações pouco analisadas como a Tunísia, a Rússia, o Líbano e a China ― e discutindo longamente o caso do Brasil ―, o autor faz em Capital e ideologia um apanhado que remonta às sociedades pré-Revolução Francesa e chega aos dias de hoje, para mostrar como a economia não é produto da natureza: como construção histórica, é passível de ser mudada e até revolucionada. 

Tido como uma continuação de O capital no século XXI, mesmo podendo ser lido como obra independente, Capital e ideologia está destinado a ocupar um lugar de destaque nas discussões políticas, econômicas e sociais do Brasil e do mundo graças à crítica contundente que faz das políticas atuais e por sua proposta arrojada de um novo sistema econômico, mais justo. 

Já "The Power of Creative Destruction" é, em essência, a ponte analítica que conecta a intuição genial de Schumpeter do século XX com as realidades e os dados do século XXI. Ele pega a metáfora poderosa da destruição criativa e a transforma em um quadro analítico robusto, capaz de informar políticas públicas. 

Enquanto Schumpeter nos presenteou com um diagnóstico profundo e uma prognose sombria, Aghion, Antonin e Bunel nos oferecem um manual de sobrevivência e prosperidade na era da aceleração tecnológica. Eles confirmam que Schumpeter estava certo sobre o motor, mas demonstram que, com as instituições corretas, podemos domar a fera da destruição criativa e direcionar seu poder para construir nações mais prósperas, inovadoras e, crucialmente, mais justas. Piketty no mostra que na História foi o Capitalismo como Ideologia que produz absurdas desigualdades e exclusões brutais em beneficio de 1 % da humanidade. Somos 99 % da humanidade e o Capitalismo destruí-o o planeta .

 

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