SABERES TRANSDISCIPLINARES E ORGÂNICOS.

quinta-feira, 20 de novembro de 2025

A Espiral do Eu: Da Semente do Egoísmo ao Vácuo Universal por Egidio Guerra





Tudo começa com um sussurro, quase imperceptível: a ideia de que o "eu" é o centro do universo. É um egoísmo minúsculo, um broto frágil que se alimenta de pequenas negligências: a prioridade sempre sobre os outros, a conversa que sempre retorna a si mesmo, a incapacidade de verdadeiramente celebrar o sucesso alheio. Nessa fase, o ego é uma planta de apartamento, cuidada com devoção, mas ainda contida. 




Então, ele começa a crescer. Já não cabe mais no indivíduo e começa a se expandir para o círculo de amigos. As relações tornam-se transacionais; os amigos são avaliados por sua utilidade em sustentar a imagem, o conforto ou a ascensão do eu. A lealdade é uma rua de mão única. O amor, nesse contexto, se transforma em posse, e a empatia, um recurso escasso. Os valores como a humildade e a generosidade são os primeiros a serem sacrificados no altar do self. 



O próximo território a ser anexado é o lugar onde se mora. A comunidade vira um palco para sua grandeza. O sucesso não é mais pessoal, mas cívico – desde que a cidade reflete sua glória. O bem-estar coletivo é secundário ao triunfo pessoal. Os limites entre o que é público e o que é "seu" começam a se dissolver, pois o ego não reconhece fronteiras que não as suas próprias. 


A expansão, agora desenfreada, avança para o país. O indivíduo se confunde com a pátria. Seu sucesso é o sucesso da nação; sua crítica, um ato de traição. Ele se veste com as cores da bandeira, mas apenas para emoldurar seu próprio retrato. Esse nacionalismo do ego não é um amor genuíno pela terra e seu povo, mas uma ferramenta para amplificar seu poder e influência. Figuras como Donald Trump exemplificam essa fase, onde a política e o Estado se tornam extensões de uma marca pessoal, e a verdade é o que melhor serve à narrativa do eu. 



O salto para o palco internacional é inevitável. O ego agora é um fenômeno global. Visionários como Elon Musk prometem salvar a humanidade, mas suas ações são frequentemente movidas por uma vaidade colossal, uma necessidade de ser visto como o salvador, o gênio inigualável. O mundo torna-se um tabuleiro de xadrez para suas ambições, e bilhões de pessoas, meros peões em seu jogo. Aqui, a violência não é mais apenas física, mas estrutural: decisões que afetam ecossistemas inteiros e o futuro da espécie são tomadas para sustentar um legado, alimentar uma ideologia pessoal. 



Finalmente, o ego almeja o universal. Ele quer deixar uma marca na história, ser um nome gravado não em uma pedra, mas no
tempo. É a fase dos ditadores messiânicos e dos conquistadores delirantes. Mussolini sonhava com um novo Império Romano, Hitler com um Reich de mil anos. Eles não queriam apenas governar; queriam redefinir a realidade de acordo com sua vontade distorcida. Nesse estágio, o amor está totalmente extinto, substituído por uma adoração doentia ao poder. Tudo – riqueza, sexo, drogas, influência – é combustível para uma fogueira que nunca se apaga, pois o vazio interior é um abismo que nada preenche.
 



A Psicopatia do Poder e a Morte da Alma 

Essa jornada de expansão do ego é um espelho perturbador da psicopatia. O psicopata clínico age sem empatia, sem culpa, vendo os outros como objetos. Da mesma forma, o ego em sua fase final opera em um vácuo moral. A violência, seja ela verbal, social, política ou física, torna-se um instrumento banal para a manutenção do poder. A destruição da vida dos que estão próximos – familiares, colegas, cidadãos – é apenas um dano colateral em sua saga pessoal. 

Mas o dano mais profundo é interno. Ao desconectar-se da empatia, dos valores e do amor, o indivíduo destrói sua própria humanidade. Ele se tranca em uma fortaleza de ouro e aço, mas é uma fortaleza vazia, habitada apenas pelo eco de sua própria vaidade. A vida perde seu significado mais profundo, que está na conexão, na vulnerabilidade e no cuidado com o outro. 

No final, a espiral do egoísmo universal não construiu um império; cavou um túmulo. Destrói a vida do próximo, corrói a própria alma, contamina a sociedade e, se não contida, pode levar o mundo à beira do abismo. A lição mais dura é perceber que o antídoto para essa patologia não está em conquistar o mundo, mas em dominar a si mesmo; não em expandir o ego, mas em cultivarmos a compaixão, o único sentimento verdadeiramente capaz de nos conectar uns aos outros e de salvar a nós mesmos de nossa própria ruína. 

 

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