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domingo, 9 de novembro de 2025

Noam Chomsky: O Gigante Intelectual da Dissidência

 



Noam Chomsky: O Gigante Intelectual da Dissidência 

Avram Noam Chomsky, nascido em 7 de dezembro de 1928 na Filadélfia, Estados Unidos, é amplamente considerado um dos intelectuais públicos mais importantes e influentes do mundo moderno. Sua trajetória é marcada por uma dualidade fascinante: a de um cientista que revolucionou a linguística e a de um ativista político incansável que dedicou sua vida a criticar as estruturas de poder. 

A Trajetória de Vida e a Revolução na Linguística 

Filho de um renomado estudioso do hebraico, Chomsky foi imerso em um ambiente de erudição e cultura judaica desde cedo. Seu interesse pela política surgiu na adolescência, lendo textos anarquistas e socialistas libertários. 

Academicamente, Chomsky encontrou seu lar no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) em 1955, onde construiu toda a sua carreira. Foi lá que, em 1957, ele abalou os alicerces da psicologia e da linguística com seu livro "Estruturas Sintáticas". Nele, Chomsky propôs a teoria da Gramática Gerativa-Transformacional, argumentando que a capacidade de adquirir e usar a linguagem é inata ao ser humano, uma faculdade biológica hardware no cérebro. Ele postulou a existência de uma "Gramática Universal" – uma estrutura profunda comum a todas as línguas humanas. 

Essa revolução, muitas vezes chamada de "Revolução Cognitiva", deslocou o foco do behaviorismo (que via a linguagem como um hábito aprendido) para a mente humana e suas estruturas inatas, influenciando não apenas a linguística, mas também a psicologia, a ciência da computação e a filosofia. 

O Pensamento Político e as Lutas 

Paralelamente à sua carreira acadêmica, Chomsky desenvolveu um denso e sistemático corpo de crítica política. Seu ativismo ganhou força durante a Guerra do Vietnã, e desde então, ele se tornou uma das vozes mais proeminentes da esquerda antiautoritária em todo o mundo. 

Seu pensamento político pode ser resumido em alguns pilares centrais: 

  1. A Crítica à Propaganda e aos Meios de Comunicação: Em sua obra seminal "Manufacturing Consent: The Political Economy of the Mass Media" (escuta com Edward S. Herman), Chomsky elabora o "modelo de propaganda". Ele argumenta que os meios de comunicação de massa em sociedades capitalistas não são instrumentos de informação crítica, mas sim de manipulação e consentimento. Eles funcionam como filtros que beneficiam os interesses das elites corporativas e estatais, fabricando o consentimento do público para políticas que não servem ao seu interesse. 

  1. O Anarcossindicalismo e Socialismo Libertário: Chomsky identifica-se com uma tradição anarquista e socialista libertária, inspirada em pensadores como Mikhail Bakunin e Rudolf Rocker. Ele defende a eliminação de todas as estruturas de poder hierárquicas e coercitivas – seja o Estado, as grandes corporações ou o capitalismo – e sua substituição por organizações livres e voluntárias de base, como sindicatos e conselhos de trabalhadores. 

  1. A Análise da Política Externa Americana: Grande parte de sua obra é dedicada a uma análise minuciosa da política externa dos EUA. Chomsky a caracteriza como essencialmente imperialista, projetada para manter um "Grande Área" de influência global que beneficie interesses corporativos norte-americanos. Ele documenta e denuncia incessantemente intervenções militares, golpes de estado apoiados pelos EUA e o apoio a regimes tirânicos quando estes servem aos interesses geopolíticos de Washington. 

  1. A Defesa Incondicional da Liberdade de Expressão: Baseando-se em princípios anarquistas e liberais clássicos, Chomsky é um defensor intransigente da liberdade de expressão, mesmo para opiniões mais odiosas. Ele argumenta que o direito ao dissenso é a base de qualquer sociedade livre e que a história mostra que o poder sempre tenta silenciar aqueles que o desafiam. 

Livros Fundamentais 

Além de "Estruturas Sintáticas" e "Manufacturing Consent", algumas de suas obras mais importantes incluem: 

  • "American Power and the New Mandarins" (1969): Sua primeira grande incursão na crítica política. 

  • "Poder e Terror" (2003): Uma série de palestras e entrevistas após o 11 de Setembro, criticando a "Guerra ao Terror". 

  • "Hegemony or Survival" (2003): Um best-seller que analisa a busca pelo domínio global pelos EUA. 

  • "Understanding Power" (2002): Uma compilação abrangente de suas ideias políticas, acessível e em formato de perguntas e respostas. 

  • "Who Rules the World?" (2016): Uma análise do sistema internacional contemporâneo. 

Chomsky e Bernie Sanders: Uma Aliança Tática Crítica 

A relação de Chomsky com Bernie Sanders é de apoio crítico e aliança tática, refletindo o pragmatismo político do linguista. 

Chomsky vê em Sanders uma figura única na política americana: um socialista democrático que, diferente da maioria dos políticos, manteve uma consistência em suas posições por décadas e construiu um movimento popular em torno de ideias como Medicare for All, educação superior gratuita e a luta contra a desigualdade econômica. 

Chomsky apoiou publicamente a candidatura de Sanders nas primárias democratas de 2016 e 2020. Ele via a campanha de Sanders não como um fim em si mesma, mas como a "semente" de um movimento político mais amplo. Sanders, em sua visão, conseguiu popularizar ideias socialistas que eram consideradas tabu nos EUA e mobilizar uma nova geração para a política. 

No entanto, as diferenças ideológicas são profundas. Chomsky é um anarquista que acredita na abolição do Estado e do capitalismo. Sanders é um socialista democrático que busca usar o aparato estatal para regular o capitalismo e criar um estado de bem-estar social nos moldes escandinavos. Chomsky frequentemente aponta que as propostas de Sanders, embora radicais para os EUA, são moderadas no contexto europeu. 

A estratégia de Chomsky sempre foi a de apoiar o "menor mal" em eleições (o candidato democrata contra o republicano) para evitar danos maiores, enquanto se constrói movimentos populares de base fora do sistema eleitoral. Nesse sentido, Sanders representava a melhor oportunidade para mover a janela do debate político para a esquerda e criar espaço para essas mobilizações de base. 

Legado 

Aos 95 anos, Noam Chomsky permanece como um farol de integridade intelectual e coragem moral. Seus trabalhos na linguística garantiram seu lugar na história da ciência. Sua luta política incansável, sua capacidade de desmontar a propaganda e sua defesa ferrenha dos oprimidos garantiram seu lugar na história da dissidência. Ele é a prova viva de que o papel do intelectual é, acima de tudo, "dizer a verdade e expor as mentiras", independentemente do preço a ser pago. Sua vida é um testemunho do poder das ideias para desafiar o poder estabelecido. 

 

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