SABERES TRANSDISCIPLINARES E ORGÂNICOS.

quarta-feira, 19 de novembro de 2025

Dos Feudos aos Ninhos: A Luta pela Justiça social! Por Egidio Guerra




Na gramática da natureza, os ninhos são a sintaxe da vida. Eles protegem, cuidam e apoiam o desenvolvimento, sendo um útero externo onde a fragilidade se fortalece para o voo. São o arquétipo do cuidado. Já os feudos são a gramática da opressão. Eles usam, descartam e matam suas populações, transformando pessoas e territórios em recursos consumíveis. Enquanto o ninho obedece à lei do amparo, o feudo se rege pela lei do domínio. 



Esta lógica feudal, infelizmente, ainda é o DNA de muitas de nossas estruturas sociais. Em nossas raízes brasileiras, escravocratas, brutais e desiguais, os feudos e as culturas violentas da casa grande e de seus capitães do mato ainda imperam, vestidos com as roupas da modernidade. E o mais insidioso é perceber como ninhos podem virar feudos. As escolas e universidades, que deveriam ser os ninhos por excelência do pensamento crítico, onde jovens aprendizes exercitam as asas da razão, muitas vezes se tornam feudos intelectuais. Neles, a opinião crítica de alunos e professores é calada, obrigados a trocar a verdade incômoda pela mentira conveniente. 



crime organizado, por sua vez, transforma presídios em feudos para oprimir ainda mais populações já excluídas. Mas ao contemplarmos essa perversidade, somos levados a uma pergunta crucial: qual a diferença fundamental entre esses feudos do crime e os feudos legais de nossos ricos e poderosos? Bilionários e políticos corruptos que usam partidos, governos, congressos, bancos e a justiça como feudos entre amigos do Rei, Oligarquias e elites para oprimir a sociedade? A violência sistêmica que estrangula oportunidades, nega direitos e mata o futuro de crianças e jovens, impedindo seu desenvolvimento e despertar humano, não é uma versão "aceita" da mesma lógica de extermínio? 





Para encontrar o caminho de volta ao ninho, precisamos resgatar o sentido original das coisas.  

A palavra economia (oikonomia, em grego) significa "lei da casa". A lei da casa é a do ninho: administrar os recursos para o bem-estar de todos, um princípio vivido plenamente por comunidades indígenas e quilombolas. Para eles, a terra não é um feudo a ser espoliado, mas um ninho sagrado a ser honrado, um parente. 




gestação de um bebê é a metáfora suprema do ninho. No útero, a vida é protegida, nutrida e encorajada a se desenvolver em toda a sua potência. Nosso desenvolvimento humano exige esse mesmo ambiente de "ninho" – de afeto, estímulo e segurança – em todas as fases da vida. 



poesia e a arte são a materialização desse espírito livre. Elas são o canto do pássaro que se libertou do feudo, a criação livre sem opressão, o voo da alma sobre as muralhas do controle. 


Por fim, as grandes tradições espirituais ecoam essa sabedoria. A Bíblia retrata um Deus como a águia que "protege sobre seus filhotes" (Deuteronômio 32:11), um símbolo divino de proteção. A Cabala ensina que a criação surgiu por Tzimtzum – um divino "fazer espaço", um ato de retração amorosa para que o outro pudesse existir. A lei divina, portanto, não é a de um senhor feudal, mas a do Jardineiro que cultiva a vida. A Terra e a própria vida são, em sua essência, ninhos divinos confiados à nossa guarda. 



A esperança, no entanto, é ativa. Feudos podem se libertar. O grito é o primeiro verso da rebeldia. A luta organizada é a construção coletiva de novas asas. A colaboração é a tecelagem de um novo ninho, comunitário e justo. Cabe a nós, em cada esfera de ação, discernir e agir: estamos construindo ninhos que acolhem e elevam, ou mantendo feudos que esmagam e descartam? A escolha final é entre a lei da casa, que é a lei do cuidado, e a lei do feudo, que é a lei da opressão. Que tenhamos a coragem de escolher, em gritos e em ações, o ninho. 





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