Meu caro,
Escrevo-te de Oran, onde o sol esmaga as pedras e o mar insiste, obstinado, contra o rochedo. A tarde está quente, pesada, e essa asfixia familiar trouxe-te à minha mente. Disseram-me que atravessas um tempo de dúvida, que perguntas pelo sentido do teu labor, pelo peso dos teus dias. Reconheço esse abismo. E, por isso, falo-te não como um sábio, mas como um condenado a partilhar a mesma cela.
Primeiro, não te exijas a felicidade. É uma ideia moderna e desonesta. Em vez dela, busca a fidelidade. Sê fiel ao que em ti se rebela contra a morte, contra a injustiça, contra o absurdo do simples fato de termos de morrer. O mundo é irracional, é verdade. Não há um sentido superior inscrito nas estrelas. Mas essa constatação não é um precipício; é o chão firme, finalmente despojado de ilusões, sobre o qual podemos construir.
Imagina Sísifo. Todos te pintam seu suplício: a pedra que sobe e sempre recai. Mas vê-o no instante em que volta a descer. Esse momento é tudo. Ele está só, com seu corpo dolorido, e o horizonte pertence só a ele. Nesse intervalo, ele é mais forte que seu rochedo. A tua pedra – o trabalho rotineiro, o amor que foge, a dor que persiste – também recairá. Não duvides. A revolta está em reconhecê-la como tua, e em afastar, com um gesto claro, os deuses que te mandariam amaldiçoá-la. A felicidade de Sísifo, e a nossa possível, nasce desse confronto consciente, desse "tudo está bem" dito no fundo do poço.
Não vivas de esperança. É um exílio do presente. Esperar um futuro redentor é trair a beleza crua e os apetites do agora. A vida é feita de sol sobre a pele, do cheiro do mar depois da chuva, do vinho partilhado, da fadiga merecida ao fim de um dia honesto. É tudo o que temos. E é imenso. Ama a terra mais que os seus significados. Como o estranho Mersault sob o céu noturno, aberto à "terna indiferença do universo", deixa que essa indiferença te liberte, e não te anule. Ela te desobriga de papéis. Permite-te ser simplesmente.
Mas atenção: essa "indiferença" do cosmos não é licença para a indiferença entre os homens. Somos condenados a viver juntos. E porque não há céu nem inferno que nos julgue, a única medida do bem e do mal somos nós. Quando vires a injustiça – e verás –, não digas "é assim o mundo". Toma partido. Do lado daqueles que sofrem. A revolta nasce do primeiro "não" dito a um destino esmagador, mas só se completa no "sim" a uma comunidade de homens livres e finitos. Luta pelo pão, pela justiça, pela dignidade. Luta sabendo que a vitória será sempre temporária, que a pedra rolará outra vez. Luta mesmo assim. É na luta compartilhada que esquecemos nosso isolamento.
Por fim, meu amigo, ama a vida com um amor desesperado, pois é tudo o que temos. Não procures ser um herói ou um santo. Procura ser um homem. Com as mãos calejadas, o coração inquieto, e os olhos bem abertos para a beleza insustentável deste mundo, que ignora nosso amor e nosso ódio com a mesma soberania.
No crepúsculo, o Mediterrâneo fica cor de pêssego. É um espetáculo gratuito e sem testemunha. É suficiente.
Tua presença neste mundo insensato já é uma revolta. Vive-a com os olhos claros.
Solidariamente,
Egidio Guerra
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