O retorno de um grande amor não é um simples reencontro. É um terramoto silencioso que ressoa no mais profundo do ser, um reencontro de almas que o tempo e a distância tentaram, em vão, separar. É a melodia mais doce para quem insistiu em esperar, e a sinfonia mais aterradora para quem hesita em tocar a porta. A literatura, o cinema e a vida real estão repletos desses momentos de volta, onde a esperança e o medo dançam uma valsa intricada.
Por que hesitar diante do tão sonhado reencontro? Nenhuma história ilustra melhor esse paradoxo do que a de Odisseu e Penélope, de Homero. Após vinte anos de guerra e viagem, o herói finalmente volta a Ítaca. Mas ele não corre para os braços de sua rainha. Em vez disso, ele se disfarça de mendigo. A vergonha e o medo são seus companheiros. Vergonha dos anos perdidos, da sua aparência envelhecida e marcada pela guerra, da possibilidade de não ser mais o homem que ela amou. E medo: medo de que ela tivesse seguido em frente, medo de que o amor tivesse se esvaído na sua longa ausência, medo de que o palácio estivesse ocupado por outro. Ele precisava ter certeza de que o amor dela não era pela lembrança de um homem, mas pelo homem que ele ainda era. A prova do tear, onde Penélope tecia e desmanchava a mesma peça para enganar os pretendentes, foi a resposta silenciosa que ele precisava: a fidelidade não era à sua memória, mas à sua essência.
Esta dúvida é universal. Quem dá o primeiro passo? Quem se arrisca a estender a mão após tanto tempo? Não há uma regra, mas sim um delicado jogo de intuição e coragem.
Às vezes, é a força tranquila de quem esperou que abre a porta. Como Penélope, que manteve a chama acesa, ou como a poesia de Florbela Espanca, que mesmo na angústia clamava: "Que moinho de vento me tornei!/.../Eu que me havia de morrer de amor!". A pessoa que espera muitas vezes é a âncora, o porto seguro que sinaliza: " ainda estou aqui, o lugar segue teu".
Outras vezes, é o arrependimento transformado em ação de quem partiu que inicia o retorno. É o amante que, após perceber o vazio da vida sem o grande amor, precisa vencer o orgulho. É a essência da pergunta feita em tantas canções, como no samba de Paulinho da Viola: "Pra que mentir, dizer que não quer voltar?/ Eu sei que sim, você vai me perdoar". É o gesto grandioso, como em "O Morro dos Ventos Uivantes", onde a paixão de Heathcliff e Catherine é tão intensa que transcende a morte, um chamado eterno que não pode ser ignorado.
Histórias reais também ecoam esse dilema. O compositor Robert Schumann e a pianista Clara Wieck travaram uma batalha judicial contra o próprio pai dela para ficarem juntos. Após a vitória, o primeiro passo foi selado não apenas por cartas de amor, mas por uma luta conjunta. Já o filósofo Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir, mesmo com um relacionamento aberto, sempre retornavam um ao outro, porque o primeiro passo era, na verdade, uma contínua conversa intelectual e emocional que nunca cessou.
O primeiro passo pode ser um simples "olá" após uma década, um like em uma foto antiga, ou um convite para um café. Pode ser um poema, uma música que lembra ambos, ou apenas um silêncio que diz tudo. No final, o retorno sempre exige que dois passos se encontrem no meio do caminho: um de quem volta, e outro de quem, de coração aberto ou cauteloso, decide esperar.
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